19 dezembro, 2017

FEE, PIB e Governo Sartori


Querido diário:

O governo Sartori é uma desgraça, um governo de Q. I. de jegues, que, aliás, foram sacrificados por motivos torpes. Seus Q.I.s, dos governantes, também. Parece que o RGS é um estado que os escolhe a dedo, de sorte a nunca melhorar, a nunca perder as quatro patas cravadas na mais intensa mediocridade e amadorismo. O governo Sartori intenta acabar com fundações de relevo para lidar com frações delegáveis da administração pública. E não entende que as "frações delegáveis" não são todas. Há por certo, falhas de governo no mundo das três dimensões lá de fora. E há, talvez ainda mais severas, quando estamos falando de políticas informacionais ou ambientais, quando elas são delegadas às demais instâncias de agregação das preferências societárias, nomeadamente, o mercado e a comunidade. Não fosse um governo de Q.I. reduzido, saberíamos quais são os economistas de maior porte do rame-rame da profissão no estado, os economistas pró-mercado que se fazem ouvir pela equipe, coordenada (?) por intelectuais do porte do sr. Carlos Búrigo, secretário do planejamento. A própria secretaria que ele, imagino que contra a vontade, chefia, tem profissionais modernos que bem -se fossem ouvidos- poderiam dizer algo sobre as tarefas governamentais indelegáveis.

Por mais nobre que seja a delegação de funções à comunidade ("produtores independentes livremente associados"), há limites dados pela comparação da famosa dupla compre-ou-faça. Para os versados na teoria econômica moderna, Ronald Coase, aquelas coisas, usar o mercado tem um custo, o custo de mercado, como disse o velhinho lá nos anos 1930, hoje atendendo pelo título de custos de transação. Quer dizer, se compro um espumante para dar de presente, preciso certificar-me que o produto não chegará deteriorado às mãos do destinatário. E o vendedor haverá de preocupar-se com as cédulas de dinheiro que lhe carreio às mãos. Ambos incidimos em custos precisamente por usar o mercado.

Pois então. O governo acha que pode delegar ao setor privado o cálculo do PIB, pois anuncia que fechará a FEE, respeitável instituição "de economia e estatística" tida como auxiliar da secretaria de planejamento, e já volta o mr. Búrigo. Nada é mais simples que calcular o PIB: remuneração dos empregados mais excedente operacional bruto mais impostos indiretos menos subsídios. Então que ele calcule, pega a remuneração dos empregados, ok, e por aí vai. Mas como imputar (epa, imputar, saberá lá aquela macacada o que é isto?), por exemplo, o valor adicionado à economia pelo tráfico de drogas ilegais, o valor de um assassinato, o gasto de combate à poluição ambiental precisamente devida à necessidade de reciclar o lixo lá da casa dele? E como dar conta dos lucros operados no "caixa 2"? E a sonegação de impostos não contabilizados nem na folha de pagamentos nem nos lucros "retidos"?

Saberá ele, o Búrigo, que o valor adicionado tem três óticas de cálculo, que as três são encapsuladas numa matriz de contabilidade social e que, se não se calculasse o PIB (visão dos produtores), mas calculasse a renda (visão dos locatários dos fatores) ou a despesa (visão das instituições), daria tudo na mesma? E saberá ele que todo mundo calcula as três óticas, a fim de lidar com as incongruências informacionais? Resultado: precisa-se de um aparato inteiro de estatísticas sobre o produto, a renda e a despesa, a fim de dar coerência ao sistema. Precisa-se de fazer estimativas para todo o estado, determinar as compras e vendas de e para outros estados, as transações com o exterior, as rendas de, digamos, paraibanos, que por aqui labutam e que são remetidas à Paraíba ou a Santa Catarina, sei lá... Saberá Búrigo e sua trupe que, além do PIB estadual (anual e trimestral, global e setorial, nominal e real), calcula-se o PIB municipal (global e setorial)? E luta-se para fechar o ciclo com os componentes da renda e os demais da despesa? Especialmente quanto menor o grau de agregação destas estatísticas, mais complicado torna-se divulgá-las sem  quebrar a confidencialidade -para fins estatísticos- que o informante individual merece, requer e tem garantida.

E saberá ele aquilo dali do outro parágrafo de PIB real exige mais montanhas de cálculos? E com estes cálculos passa-se a contar com o cálculo da inflação estadual? E saberá ele que, contando com boas estimativas do PIB (produto) e despesa interna bruta setoriais, estamos a um passo da montagem da matriz de insumo-produto (que a FEE faz periodicamente)? E, com a matriz de insumo-produto, estamos a um passo da matriz de contabilidade social, que a FEE terá em seus planos de expansão da base de dados)? E saberá ele que este conjunto

.a contas do produto, da renda e da despesa
.b matriz de insumo-produto
.c matriz de contabilidade social

monta-se uma base de dados invejável capaz de fortalecer o grau de crença nas informações alcançadas individualmente em cada metodologia para sua obtenção? Saberá? Mais provável é encontrarmos porcos com asas.

Pois é: tem que ter profissionais tratando disto, que se especializam, que estudam este objeto. E tem que ser do governo, da administração direta ou indireta? Primeiro, uma vez que tive o hoje sabidamente honroso cargo de fazer parte da primeira equipe que se encarregou destes cálculos na FEE, acho óbvio que ela deve ser mantida, nunca deveria ter-se cogitado de fechá-la. Segundo, o presidente do IBGE insurgiu-se contra o amadorismo da decisão do governo Sartori. Olha aqui a Zero Hora, página 16, a cronista Marta Sfredo:

   Conforme o IBGE, a posição [da negativa do IBGE em compartilhar sua base de dados com uma firma de consultoria] tem origem no fato de que o presidente tinha a mesma informação da coluna: a de que o núcleo relacionado ao PIB migraria para a Secretaria de Planejamento, mantendo as informações na esfera pública.
   Ainda segundo o instituto, não há precedente no país de levantamento feito por terceirizado.

Torna-se claro: a inguenorância dos próceres locais não faz mal apenas ao cotidiano sul-riograndense, mas desmoraliza uma terra avassalada por sucessivos e incompetentes arranjos políticos.

DdAB
P.S. a imagem que nos encima recolhi-a do Google Images ao digitar "governo sartori uma piada". Aí pensei estar lendo "nhoque", ao invés de "choque" e achei apropriado, principalmente depois de ter ouvido que as novas gastronomias estão fazendo também nhoques de banana. Como essa macacada me parece não apenas gostar mas também ser um avantajado núcleo de bananas, achei tudo nos trinques.
P.S.S. Já referi a composição do PIB. Repito e amplio:
Produto interno bruto a preços de consumidor:
PIB = remuneração dos empregados mais excedente operacional bruto mais impostos indiretos líquidos de subsídios.
Renda interna bruta:
Renda das famílias mais renda do governo mais renda líquida das empresas de comércio exterior mais poupança dos trabalhadores mais poupança dos capitalistas.
Despesa interna bruta:
Consumo das famílias mais consumo do governo mais exportações líquidas de exportações mais investimento das empresas domésticas.

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