06 agosto, 2014

Metodologia Econômica e Martin Bronfenbrenner


Querido diário:

Na dissertação de mestrado que escrevi para o atual Programa de Pós-Graduação em Economia da UFRGS (defendida em julho/1977), fui orientado pelo prof. Antonio Carlos Fraquelli. Ele, na época, gostava muito do artigo:

BRONFENBRENNER, Martin (1973) Introducción a la metodologia economica para lectores de pretensiones intelectuales medias. In: KRUPP, Sherman Roy ed. La estructura de la ciencia economica. Madrid: Aguillar, 1973. p.5-29.

Na época em que li o artigo pela primeira vez, penso ter apreendido algumas coisas, mas juro hoje que certamente o material era mais rico do que minha maturidade intelectual dos 30 anos de idade permitiu perceber à época. Poucos anos depois (menos de cinco ou dez), passei a lecionar introdução à economia e -pimba!- já fui logo colocando na roda alguma coisa da visão de Bronfenbrenner. Hoje compartilho minhas notas de então sobre as seções iniciais do artigo. Lá vai:

I DEFINIÇÃO DE ECONOMIA
   Não existe nenhuma definição satisfatória de economia ou ciência econômica. Para ser satisfatória, deveria vincular economia com:

ciências empresariais
história
política
direito
psicologia
sociologia
engenharia
geografia
etc.

Há definições desesperadas, como a de Jacob Viner ("economia é o que fazem os economistas"). E a da filha do autor ("economia é onde papai desenha essas linhas e escreve esses números"). Ele próprio utiliza provisoriamente a definição de Lionnel Robbins modificada por Oskar Lange: economia é o estudo sistemático do ajuste social à escassez de bens e recursos e da administração de bens e recursos escassos.

Define-se escassez de um bem como a condição de que, ao preço nulo, a demanda exceder a oferta. O ar, por exemplo, não é escasso, pois nada pagamos para respirar à vontade.

Nem todos dizem que a escassez é inevitável. Comunistas, tecnocratas e outros críticos "maximalistas" dizem que se pode agir sobre a oferta com maiores avanços tecnológicos e sobre a demanda, não a inflando com técnicas de promoção de vendas, que não haja gastos de defesa e que todos dediquem cursos períodos de trabalho à comunidade, todos os bens e serviços podem tornar-se gratuitos em pouco tempo.

II A ADMINISTRAÇÃO DA ESCASSEZ
   Há três respostas diferentes para as questões fundamentais da economia
[usando o formato que aprendi com os alunos, temos:
1. o que, quanto produzir;
2. como produzir e
3. para quem produzir]
:: primeira resposta - na sociedade primitiva quem responde é o costume
:: segunda resposta - no capitalismo, é o mercado
:: terceira resposta - no socialismo é a planificação.

Para avaliar o desempenho dos sistemas econômicos que resolvem seu problema da escassez por meio do costume, mercado e planificação, há seis critérios:

:: quatro são econômicos:
.a. nível de vida
.b. taxa de crescimento do nível de vida
.c. equidade na distribuição da renda e da riqueza
.d. estabilidade do nível de vida quanto pressões descendentes

:: dois são quase-econômicos
.e. compatibilidade do sistema econômico com as liberdades civis
.f. compatibilidade do sistema econômico quanto à saúde física e mental dos cidadãos.

Quanto aos critérios .e e .f: um sistema baseado no trabalho escravo viola o critério das liberdades civis. Um sistema que sacrifique a segurança industrial em benefício do aumento da produtividade viola o critério da saúde física e mental.

III ECONOMIA POSITIVA E ECONOMIA NORMATIVA
   Economia positiva - propõe-se a dizer como as coisas são.
Economia normativa: diz como as coisas devem ser.

A questão é: estas podem ser "científicas" ou "objetivas"? Examinando a Figura 1 (lá de cima) podemos transformar a questão em: os economistas podem, enquanto economistas e não como cidadãos interessados, fazer recomendações de implementação de política econômica?

Um possível acordo entre o sim e o não é que os economistas, ao fazerem suas recomendações, deveriam distinguir perfeitamente entre as bases positivas e as normativas que fundamentam suas posições, visto que sua competência profissional (se existe) se concentra no lado positivo. E ainda, quanto ao caráter normativo cedeu relativamente ao ideal, a fim de que a medida proposta possa ser implementada politicamente.

IV A ECONOMIA COMO CIÊNCIA
   A economia, tanto positiva como normativa, é uma ciência? Depende da definição de ciência. Então ela o é, tal como a medicina ou a meteorologia.

Entendendo ciência como um "corpo organizado de conhecimentos", há uma parte da economia positiva que é, mas se entendermos ciência como enfatizando os métodos de laboratório ou avaliações quantitativas, comparando resultados previstos com os observados, então a parte "científica" é menor.

Evidentemente a economia não usa métodos de laboratório [hoje em dia, M.B. não diria mais isto...]. Os casos mais estreitos de analogia com as ciências naturais referem-se à astronomia e à meteorologia. Estas, tal como a economia, têm buscado extensivamente apoio na matemática e na estatística, a fim de substituir os métodos de laboratório.

O uso da matemática ganhou aceitação universal em virtude dos resultados quantitativos ou qualitativos que foram alcançados com sua ajuda.

Mas aí surge a questão: os teoremas da economia são "certos" como os da álgebra ou geometria? Neste ponto, devemos diferenciar o que é um modelo e o que é uma teoria. De acordo com Andreas Papandreou:

modelo (é uma simplificação da realidade que) se deduz de as premissas ou axiomas e, neste sentido, pode ser considerado como absolutamente certo, embora o tempo possa fazê-lo deixar de aplicar-se a uma situação concreta. Um modelo econômico que explica uma situação real com seus teoremas pode chamar-se de teoria econômica. [Eu, 40 anos depois, discordo. Falo aqui e ali em: modelo teórico (e.g., q = f(p), modelo empírico (e.g., q = a - bp e modelo experimental (e.g., por exemplo, q = 2 - 0,3p) para uma função demanda elementar].

De fato, na maioria das proposições da teoria econômica, as magnitudes dos valores probabilísticos do poder de explicação dos fenômenos são inferiores aos dos físicos ou astrônomos. Mas isto é só uma diferença de grau.

Sendo ou não científica, a economia é, pelo menos, "objetiva"? Quer dizer, os profissionais da economia se aproximariam dos mesmos resultados partindo dos mesmos dados? Esta aproximação é grande, mas tem possível analogia com os diagnósticos médicos.

A objetividade que a economia possa ter baseia-se em seus aspectos positivos: os fatos, a análise técnica, etc. Não há razão particular para esperar que os juízos de valor básicos do economista ou suas recomendações de política sejam independentes de sua classe social, cultura, grau de desenvolvimento do país, etc.

V EMPIRISMO IMANENTE E DESACORDO PERPÉTUO
VI A CONTROVÉRSIA DE FRIEDMAN
VII A CONTROVÉRSIA DE MYRDALL
VIII TOLERÂNCIA METODOLÓGICA

DdAB
P.S.: vale a pena ver, para o mesmo tema e tratamento correlato, as seguintes postagens deste blog:
.a. Oskar Lange - os prolegômenos (aqui)
.b. Lange: O objeto e métido da economia política I (aqui)
.c. Lange: O objeto da economia política - II (aqui)
.d. Lange: O objeto da economia política - III Parte/final (aqui).

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