31 janeiro, 2014

O Que Causa a Riqueza das Nações


Querido diário:

No outro dia, eu falava com amigos diletos e um deles indagou-me o que me preocupava no momento. Respondi que era o que causa a riqueza das nações. Tinha em mente minha descoberta que a renda do Congo Democrático é de US$ 400 por ano e, claro, a formulação mais moderna, menos smithiana, de causes of economic growth. E, naturalmente, a encrenca brasileira, com um PIB crescendo, nos últimos 35 anos, com a rastejante taxa de 3,5% a. a. E a inflação que retornou há uns dois anos. E a concentração da renda ainda maior do que em 1960, tudo isto.

Há muitos anos, falava-se que uma das causas do insuficiente desenvolvimento do Rio Grande do Sul era a falta de capacidade empresarial. Naturalmente, eu achava isto balela, pois parecia-me que, convidado pela taxa de lucro, algum indivíduo iria instalar-se no setor produtivo. Depois comecei a entender que podemos dizer que o crescimento da empresa depende de sua habilidade em amealhar (odeio esta palavra neste sentido...) lucros. E que os lucros são função das vendas, todas aquelas coisas.

Mas, acossado pelo tempo em que me seria dada a palavra naquela mesa de bar (era?), tentei trazer três elementos:

.a. a oferta monetária,

.b. a demanda efetiva (e.g., a construção civil associada à expansão do sistema educacional, ou o de transportes, etc.) e

.c. a capacidade empresarial.

Até hoje indago-me por que o Brasil não começa este negócio de criar uma frente de expansão, uma cunha desenvolvimentista, precisamente com a implantação de um sistema educacional decente. Não quero negar os esforços feitos pelo governo neste sentido, ou melhor, entendo que o esforço é ridículo, se comparado com a necessidade. Tanto é que, dias atrás, divulgou-se que um desses exames nacionais tipo ENEM, sei lá, teria 3 milhões de candidatos para, 0,2 milhões de vagas.

Minha proposta hoje já é formatada e o tem caráter de registro de mais uma utopia possível:

.a. cria-se a renda básica da cidadania (cumprindo a lei 10.835, de 2004, agora decenária...)

.b. com um complemento a ela, atrai-se gente para o serviço municipal (três horas de estudo por dia, três horas de ginástica e três horas de caridade)

.c. naturalmente estas três horas de estudo para adultos (pois criança, criminoso e louco está fora do esquema) iriam ensinar português, matemática e empreendedorismo.

DdAB
Por razões oblívias, pedi uma imagem ao Google com o título "on peut se promener". Ele respondeu-me com a imagem bem promenidística, provavelmente regada a espumante (em francês beberíamos champanha, não é?) alcançável com o clique aqui.

P.S.: e não podemos esquecer que há empresários produtivos, improdutivos e destrutivos (como aprendi com William Baumol), mas meu programa delineado acima presta-se exclusivamente para peneirar produtivos).

27 janeiro, 2014

Hai-Kai n. 47

Querido diário:

MILLÔR deixou-nos o seguinte hai-kai na página 53 do livro da Editora L&PM:

NESTES DIAS DO ANO
FAZ MANHÃS
DE VATICANO.

A estes três versos, o Planeta 23 trovou com:

De Vaticano
O vaticínio
cai com o pano.

DdAB
Imagem daqui.

26 janeiro, 2014

Ladrão que Rouba Ladrão...

Querido diário:

Domingo é dia de jornal (Zero Hora) relativamente pobre. Tem lixos, um caderno "Dinheiro", outro, "Donna" e o caderno principal, cujo terço final nem leio, pois não acompanho o futebol e nem três páginas finais. Em compensação, na página 22 da seção "Geral", tem uma notícia estonteante: "Ladrão Morre ao Assaltar Ladrão".

Pareceu-me um tanto estilo "fim da picada". O finado viu uma motocicleta estacionada na frente de uma farmácia e habilitou-se para levá-la. Como sabemos, pelo artigo:

Tullock, Gordon. (1967) The Welfare Costs of Tariffs, Monopolies, and Theft. Western Economic Journal. V. 5 n. 3 pp. 224–232.

Eu sempre pensei que o artigo se chamava "tariffs, taxes & theft", talvez por romantismo. Ok, voltando ao assalto. Parece que se o ladrão levasse a moto, a sociedade manteria seu nível de bem-estar, pois havia uma moto antes da transferência de propriedade e seguiria existindo a mesma moto em outras mãos. O que não podia era o dono da moto fazer despesas para manter sua posse, o que representaria um malefício social, um desperdício de recursos.

Pois bem, enquanto o ladrão -comecemos a chamá-lo de Ladrão 1- se entretinha em carregar a moto, os demais ladrões (o 2 e o 3) saíram da farmácia em que estavam localizados, pois a assaltavam, e viram o desrespeito para com sua propriedade privada. Ato contínuo, atiraram no Ladrão 1 e o mataram.

Abrevio a história, pois o que importa é refletirmos sobre o Sistema Brasileiro do Crime. A falta de justiça é tão flagrante que já chegou a hora de haver congestionamentos de assaltos/assaltantes. Talvez agora realmente tenhamos um preço para o crime: a probabilidade de chegar -em más condições- em um momento inadequado e pagar... com a vida.

DdAB
Imagem aqui.

23 janeiro, 2014

A Renda Básica Universal em Língua Estrangeira

Querido diário:

O prof. Vinicius Valent (do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul) cedeu-me o link a que se chega clicando aqui. É uma das mais poderosas propagandas de programas como a renda básica da cidadania ou o meu serviço municipal que já vi.

Hoje mesmo eu falava que

.a. rico tem menos filhos que pobres
.b. quer que pobres tenham menos filhos?
.c. basta torná-los ricos.

E como vejo estas oportunidades se articulando? Penso que no esquema

.a. três horas de ginástica por dia
.b. três horas de aula por dia
.c. três horas de trabalho comunitário por dia.

Como é que seriam as três horas de aula por dia para um adulto? Claro que devemos primeiro certificarmo-nos de que ele tomou banho e café da manhã. Depois indaga-se se ele sabe ler e escrever e contar, aquelas coisas. E às coisas que ele vai revelando desconhecer, vai-se montando a equipe para resolver. Não sabe o que é fatoração, ensina. Não sabe o que é tabuada do sete, ensina, não sabe o que é um cateto, ensina. Não sabe o que é uma tangente, ensina, e assim por diante. E TIR, débito, crédito? Ensina tudo!

E, qualquer que seja o nível do conhecimento exibido pelo candidato, ensina-se-lhe empreendedorismo. Isto permite inclusive que ele seja declarado estudante de empreendedorismo e passe a ganhar uma bolsa de estudos do Sebrae e não mais esta renda básica, bolsa família, ou o que seja.

DdAB
Imagem vem de . E a língua estrangeira está lá no site a que envio lá por cima.

22 janeiro, 2014

Terrorismo: Moral da História

Querido diário:

Alguns anos atrás, li que Yasser Arafat teria dito algo, em minhas palavras, equivalente a: "é inconcebível que a motivação política de alguém leve-o a hostilizar as populações civis". Quando li esta pérola do pacifismo, pensei estar lendo errado: não, não podia ser ele. Depois entendi: sim, era, era ele, e encaminhamento é que precisava ser mais bem conhecido!

Em compensação, aquela Carta Capital de 22/jan/2014, na p. 8 tem uma entrevista feita por Billy Culleton, falando sobre Ignacio Suescun Jauregui. A matéria chama-se de "A Aventura do Velho Terrorista" e diz-se que mr. Ignacio falou pela primeira vez com um jornalista. Pois a entrevista deixa-me ainda mais alinhado com Arafat: hostilizar e matar civis é uma baixaria.

Mas no caso, temos algo ainda pior. Obviamente não é minha intenção defender a violência contra os bascos, nem contra quem quer que seja. O que penso, baseado nos dois primeiros parágrafos da "fala", é que realmente terrorismo é um problemão. Quero dizer, terrorismo institucionalizado como forma de fazer política. Obviamente não condeno (embora não incentive) o ataque político a políticos. Como tampouco sou favorável à tortura, não sei bem o que sugerir para os casos dos políticos brasileiros contemporâneos: chineladas? broncas? caldos?

Então vejamos:

[um destrambelho descabelado] provocou a morte do então presidente espanhol Luis Carrero Blanco, candidato a suceder Francisco Franco. O carro do presidente passava pelo local [do atentado engendrado por Ignacio e outros] e todos os passageiros voaram para o céu.

Que jornalismo, sô. E o motora, era merecedor de tal viagem? Segundo parágrafo:

Considerado o mais importante atentado cometido pelo grupo separatista ETA, o ato desestabilizou o regime ditatorial que dominava o país ibérico com mão de ferro havia quase quatro décadas e favoreceu o retorno à democracia poucos anos depois, impulsionado também pela morte do octogenário Franco em 1975.

O entrevistado ainda tem a cara de pau de dizer -e o jornalista de gravar/anotar e a Cartinha de divulgar- o seguinte:

Hoje posso dizer que uma das maiores conquistas do ETA foi impedir a perpetuação da ditadura na Espanha. O assassinato de Carrero Blanco evitou centenas de outras mortes promovidas por Franco, o maior sanguinário da história da Espanha.

E quem é que não sabe que esta "democracia" tão festejada pelo jornalista Billy trouxe em seu bojo, por delegação do octogenário Franco precisamente de volta a monarquia espanhola, que impera no poder até hoje, com todos os escândalos de dinheiro e elefantes. Claro que se impõe um leve exercício contrafactual: que seria da Espanha sem a monarquia? E quais as chances de sucesso para a república se aquele suposto sucessor autoritário de Franco tivesse mesmo sucedido o afamado bombarbeador de Guernica. Sou levado a crer que aquele Carrero Blanco não teria resistido ao passar do tempo e também ter-se-ia afastado das lides políticas. E seria possível termos hoje um governo espanhol sem o ranço monárquico.

Meu único medo é que as gerações futuras, ao saberem que leio com tanto afinco a Carta Capital semanalmente, pensem que eu também sou louco!

DdAB
Imagem: óbvia.

21 janeiro, 2014

Ciência Triste ou Arautos Moribundos? Belluzzo e o senso comum

Querido diário:

Anteontem recebi a Carta Capital de depois de amanhã, como de hábito. Na p. 35, estampa-se o artigo de Luiz Gonzaga Belluzzo. Intitulando-se "Os tropeços da ciência triste", nele o autor aponta uma série de inconveniências da ciência econômica, que ele reluta bastante em assim chamar. Começa falando em "uma (vá lá) ciência difícil.", sendo dele os parênteses daquele "vá lá". Depois fala "[...] na 'evolução' da dita ciência econômica: a longa e controvertida caminhada da Economia Política para a 'economia científica' concentrada na construção de modelos formais [...]". Agora eu é que coloquei itálico naquele "dita" e trunquei a frase do jeito que a vemos, e ela é uma mistura do próprio Belluzzo e do que ele cita de Mary S. Morgan (who?).

Eu sempre torço a cabeça, torço o bigode, torço o nariz para este tipo de abordagem. Não que me desagrade a crítica ao mundo mundano, tanto é que tenho uma campanha sistemática contra os políticos (hehehe). Mas, quando passamos a falar no mundo das ideias, acho que a solução solucionativa é mesmo a tolerância. Vá lá? Dita ciência? Pera aí, meu. Se a ciência econômica não é ciência, estamos encrencados com uma definição (belluzziana) talvez muito limitadora dos contornos do saber científico. Depois falou em Alexander Rosenberg (aqui), who?, que não me parece especialmente devotado ao estudo da belluzziana ciência triste (aqui). Diz Belluzzo:

Alexander Rosenberg, conhecido filósofo da ciência, interpelou as pretensões científicas da economia no livro [... de 1992...]. Rosenberg conclui que, na contramão da trajetória de outros saberes, a economia é insensível às mudanças de paradigma que afetam as demais ciências e tornam obsoletas ou imprestáveis certas categorias do entendimento.

Para ele, há dois tipos de economistas:
.a. "Os economistas parecem dar de ombros às mágoas da gente leiga, ainda que instruída e letrada nas coisas da ciência. Prosseguem impávidos, construindo os seus 'modelos', errando mais do que acertando as suas preivsões, lançando recomendações e julgamentos peremptórios sobre as políticas econômicas [...]"
e agora vem:
.b. "[...] em geral, sugeridas, ou até mesmo conduzidas por outros economistas."

E isto de "errando mais que acertando nas previsões"? Eu até diria o contrário: acerta-se muito mais do que se erra. O caso padrão é mesmo o da aceitação do postulado da transitividade das preferências, o caso padrão é mesmo o da concorrência levar o preço a colar no custo, aquelas coisas. Então, como é que podemos separar os economistas .a. dos economistas .b.? Um critério é estabelecer quem é "melhor", .a. ou .b.? E nos associarmos a estes (os melhores). Quando digo que os economistas acertam mais do que erram tenho em mente, por exemplo, as previsões que fazemos não apenas sobre o funcionamento do mundo de maneira ordenada amanhã, mas também outras coisas, como sabemos que a concentração está aumentando no mundo (Marx, milhares de outros), sabemos que as empresas industriais tornaram-se crescentemente bancos (à la James Clifton), sabemos que os consumidores preferem (quando os preços variam) os produtos relativamente mais baratos, sabemos e prevemos tanta coisa com sucesso que é mesmo irascibilidade falar que há mais erro do que acerto!

Além disto, será que quem está errando é o economista .a. ou é o economista .b.? Vou terminar com esta citação e fazer comentários:

[...] mais eminentes economistas modernos nos esmeros em demonstrar a harmonia do capitalismo, ou seja, a equivalência de poder entre os protagonistas das relações de mercado e a existência de forças compensatórias 'automáticas' que não só impediriam a ocorrência das crises como também colocariam todos diante de oportunidades iguais mediante a livre concorrência. Trataram de demonstrar o caráter harmônico do capitalismo e a justiça natural da concorrência em todas as esferas da vida e, portanto, postularam a impossibilidade das crises.

Harmonia do capitalismo não significa equivalência de poder entre ninguém, talvez apenas entre ofertantes e demandantes (já que, ontem, as vendas igualaram as compras...). Creio que este negócio das forças automáticas é algo que ninguém mais pensa há 50 ou 100 anos, mas Belluzzo pensa que alguém pensa. E talvez até algum destrambelhado pense mesmo nesta linha, pois tem gente para tudo, inclusive, terei ouvido dizer, há gente que adora ir à falência, outros vão ao suicídio e outros dedicam-se ao consumo desenfreado de cachaça (o que condeno...). Ademais, quem mesmo é que diz que todos têm iguais oportunidades diante da concorrência? Não se vão 100 anos desde que se fala na "concorrência entre poucos"? Ou seja, não se sabe há 100 anos que a forma dominante de mercado (não em número de empresas, mas em faturamento) é o oligopólio? Esta de justiça natural da concorrência, nesta nunca ouvira falar. Será que ele fala que, no modelo de concorrência pura, há eficiência produtiva, alocativa e distributiva? Ou será que ele se insurge contra fórmulas como y = 2x + 1, destinada a dar um número ímpar inequivocamente? Fórmulas, tá na cara, a compressibilidade algorítmica, devem ser saudadas com otimismo. E as que não são boas devem ser substituídas. Finalmente, também acho que os últimos que postularam a impossibilidade de crises morreram há 150 anos, ou um pouco menos. E Belluzzo, será que já morreu?

DdAB
P.S. Além disto, quando ele diz que "[Robert] Lucas é o pai dos Modelos Dinâmicos Estocásticos de Equilíbrio Geral", penso que tem algum erro de revisão de texto na passagem!

P.S.S. A imagem veio daqui. E tem tudo a ver com a discussão daqui.

19 janeiro, 2014

Rolês no Planeta 23: Rosana e Mais

Querido diário:

Um de meus melhores livros de 2013 foi mesmo

PINHEIRO-MACHADO, Rosana (2011) Made in China: (in)formalidade, pirataria e redes sociais da China ao Brasil. São Paulo: Hucitec, Anpocs. 340p .

Cheguei tarde, não é mesmo? Inclusive perdi a defesa da tese em 2009 (ver). Do belíssimo livro Made in China, tirei vários aprendizados muito importantes e mesmo fiz uma certa história de ficção: menti para um menino de rua que se tratava de um romance em que a autora, sem nada de autobiográfico, contava a história de uma antropóloga que se apaixonou por um camelô porto-alegrense, começou a viajar com ele em sua busca de estoques em Ciudad del Este e, de lá, encarregou-se de abrir uma sucursal de sua banca de venda de guarda-chuvas no delta do Rio da Pérola, em plena República Popular da China. E este madeinchina do título do romance teria a ver com um casal de gêmeos que a personagem (Feifei) teria tido durante uma estada no vibrante país do verdadeiramente velho oeste, pois está a oeste do velho oeste americano. O menino de rua mentiu que acreditou, mas disse "se non è vero è ben trovato", pois lera o original e o amara. Também asseverou-me que iria mentir a seus colegas de departamento tratar-se de um sine qua non da academia literária moderna. A versão da própria Rosana é bem diferente, como podemos ler na p.28:

O objetivo deste livro é remontar e dar visibilidade a essa cadeia que uniu a China ao Brasil, via Paraguai, graças ao interesse despertado pelas mercadorias baratas chinesas a partir do final dos anos 70 e início dos 80. Trata-se dos bens que são produzidos nas fábricas das Zonas Econômicas Especiais da província de Guangdong, importados pelo Paraguai por imigrantes chineses e taiwaneses e, no último estágio, comprados por comerciantes brasileiros, que os revendem em mercados populares de suas cidades.

Pois bem, meu interesse pelo assunto dela (ela, China, ela, Rosana, ergo, Elas) surgiu quando li a resenha bibliográfica feita por Pedro Fonseca (coisas aqui e aqui*)e  e publicada no indefectível (para mim) jornal Zero Hora (3/mar/2012). Mais de um ano depois, ao ler o livro, vi tratar-se de autora madura intelectualmente (para uma garota de cerca de 30 anos de idade) e já com carreira maiúscula!

Pois bem, bem. Eu mesmo já usei blusões de lã (ou acrílico) com gola rolê, eram golas enroladinhas, que protegiam a garganta contra o frio tropical (tropical no sul do Brasil?), mas que me irritavam a parte superior do pescoço ainda coberta pela barba. Daí, passou-se a falar em dar um rolê, que equivalia a dar uma banda e daí veio o bonde, um bonde de gente, algo assim, não sou muito bom nestas coisas de colher material etnográfico (mas tampouco sou, pensava mamãe, de jogar fora com a água do banho). Então o rolezinho é algo que meu editor do Google/Blog não captura e parece escapar da gola de blusão e mesmo do passeio, associando-se mais ao bonde com gente.

Seguimos com Rosana. Dá uma olhada lá embaixo com minhas duas estrelas**. E nas três ***.

E o Planeta 23? Nóis semo de opiniau que ta na ora do brazil crescê, tem que t chopin pra todos, tem que t saúde e enducação pra todos, tem que ter justiça, tem que botar os agatunados na cadeia, tem que chamar a corte internacional de aia pra dá um abeas corpus praus inocentes (ela, eu, você, e só)!

Precisa ser mais contundente?

DdAB
* E este aqui está aqui (com os recortes originais):
DE MAO A MELHOR
PEDRO CEZAR DUTRA FONSECA
Quando o professor Ruben Oliven, do Departamento de Antropologia da UFRGS, convidou-me para participar de uma banca de qualificação de doutoramento, minha primeira reação foi de tratar-se de um engano. Já havia antes participado de outras bancas, e até orientado trabalhos em áreas próximas da economia, como ciência política, administração, história e sociologia, mas na antropologia era a primeira vez. Ele esclareceu que a tese possuía forte interação com minha área de trabalho e, como orientador, julgava indispensável alguém com essa formação compor a banca. Houve época, como em meados do século XX, que Antropologia Econômica era disciplina valorizada e integrava o currículo das mais importantes universidades do mundo. Com a pós-modernidade, entraram em refluxo na academia os “paradigmas totalizantes”, como o marxismo e o estruturalismo, e o recurso às variáveis econômicas para explicar as formações sociais e suas possibilidades de transformação perdeu o charme. Ademais, interdisciplinaridade é como o “politicamente correto” – difícil quem se declare contra, mas na prática são outros quinhentos.
Justamente esse caráter de transitar entre várias áreas das ciências sociais – sem, contudo, perder sua sólida visão de antropóloga, posto que a transdisciplinaridade supõe o conhecimento especializado – é um dos pontos fortes da tese, ora publicada em livro (Editora HICITEC, 339 p.), de Rosana Pinheiro-Machado. Made in China obteve a primeira colocação da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais) entre as teses de doutoramento do país. E o referido caráter, além da notória atualidade do tema e da qualidade da pesquisa, certamente pesou, mais recentemente, para que a CAPES lhe conferisse o prêmio de melhor tese de 2011, concorrendo com todas as outras áreas do conhecimento.
O livro começa com a síntese das primeiras pesquisas da autora, ainda como estudante de graduação, entre os camelôs de Porto Alegre. Logo percebeu que estes integravam um circuito; de onde vinham aquelas quinquilharias? Quem ganhava com isso? Como chegavam até aqui, quem as trazia? Em seu mestrado, Rosana Pinheiro-Machado foi atrás das respostas. Viajou com sacoleiros, foi para a Tríplice Fronteira, entrevistou e conversou “informalmente” com chineses, taiwaneses, brasileiros, paraguaios, mulheres e homens, comerciantes, taxistas e policiais. Mas logo compreendeu que para fechar o circuito precisava conhecer a origem de tudo: a China seria o tema de sua tese de doutorado. O trabalho multi-situado traz consigo, portanto, a bagagem acumulada dessas múltiplas experiências e vivências de pesquisadora atenta e disciplinada.
A viagem “global” das mercadorias, da produção à ponta, é acompanhada e relatada em primeira pessoa e em estilo vivo e direto, o que torna a leitura agradável e de interesse de todos que querem entender com mais acuidade a cultura, a vida e as práticas cotidianas do país que, depois de décadas, consegue sinalizar para uma mudança na hegemonia das relações internacionais – a lembrar o fato mais próximo de nós, conseguiu, depois de quase um século, ultrapassar os Estados Unidos como maior parceiro comercial do Brasil. As mercadorias viajam. Em algum lugar do planeta precisam realizar seu destino: transformar-se em dinheiro. E com elas levam pessoas, mudam vidas, famílias, cidades e países. Mesmo que se resista, é impossível não lembrar a metáfora de Marx no capítulo primeiro d’O Capital, para quem elas, a partir de certa escala de produção, se autonomizam e constituem como um mundo seu – o “mundo das mercadorias” – com exigências e regras próprias, as quais subordinam os seres humanos, que parecem estar a seu serviço, confundindo quem é sujeito e quem é objeto. Mas o mesmo Marx, geralmente sisudo e não afeito a tiradas de humor mais chãs, surpreende o leitor que vira a página para começar o segundo capítulo com uma frase nada metafórica, mas de pura concreção, que na tradicional tradução da Civilização Brasileira aparece como: “Não é com seus pés que as mercadorias vão ao mercado, nem se trocam por decisão própria”.
As mercadorias precisam de pés e, portanto, de braços, de cérebros e de mentes, e aí começa o trabalho etnográfico da antropóloga. Junto com elas viajam sonhos, necessidade de sobrevivência, ânsia por ganhos fáceis e nem sempre tão fáceis, laços de solidariedade, preconceitos, mitos, conflitos e laços familiares ora desfeitos ora fortalecidos. Como no filme “Um Conto Chinês”, o espaço não mais se impõe como limite. Vende-se no camelódromo às margens do Guaíba o mesmo que em Ciudad del Este, no centro de Capão da Canoa ou nas Ramblas catalãs, nos “turcos” de São Borja as mesmas quinquilharias encontradas no Time Square ou nas lojinhas do Quartier Latin.
Difícil destacar os pontos altos em trabalhos como esse, mas devo mencionar pelo menos três. Primeiro: não fugir de questões polêmicas e, ao enfrentá-las, evitar respostas superficiais, preferindo esclarecer o teor e as nuanças da complexidade. O exemplo mais claro, e na ordem do dia da política externa, é quanto aos limites do relativismo cultural como argumento para aceitar a flexibilização de temas como direitos humanos e legislação social. A descrição de alojamentos de trabalhadores nas indústrias chinesas (nos quais a televisão, explicava o dono, era pequena, mesmo que as grandes não fossem tão mais caras, para “não distrair muito” os trabalhadores), a discriminação contra mulheres, o trabalho infantil, as jornadas superiores a 12 horas, as doenças de fadiga, o sufocar das críticas – tudo isso pode ser aceito em nome de se tratar “de outra cultura”? A autora percebe, com muita precaução, que o relativismo cultural nesses casos, mais que a originária defesa das minorias sob a égide da virtude da tolerância, serve como uma luva para a ideologia do poder e do status quo: “a China precisa crescer” é a palavra de ordem, e o nacionalismo ad hoc recomenda não importar os valores “ocidentais e burgueses”. Tudo, portanto, se consagra como legítimo, até porque os trabalhadores ora gozam melhores condições de vida em comparação com sua situação anterior: os mesmos argumentos utilizados na Inglaterra da Revolução Industrial e com relação aos nordestinos migrantes de São Paulo. Os ocidentais nem sempre entendem a China; afirma a autora: “Autoridades e empresários parecem ecoar um mesmo som, apelando para a piedade das populações vulneráveis – algo que somente um nativo seria capaz de compreender”.
Em segundo lugar, a bela descrição teórica e vivencial do guanxi, laços pessoais recíprocos que aproximam as pessoas, constituindo-se numa espécie de rede de relacionamento entre elas, incluindo autoridades e empresários, em troca de presentes e favores. É inevitável a lembrança do “jeitinho” e do “brasileiro cordial” de Sérgio Buarque de Holanda, pois não se trata de uma instituição organizada e hierárquica como a máfia italiana, mas de uma teia constituída a partir de indivíduos; e, ao incorporar representantes do Estado, dá lugar ao entrelaçamento entre o público e o privado. No Brasil? Não, na China. E tudo isso num país “cujas leis raramente são cumpridas”, no qual “ainda [se] anuncia o ditado popular ‘leis foram feitas para serem desobedecidas’ – conforme jocosamente ouvi muitas vezes ao longo da pesquisa”. Mais interessante ainda é o fato de, para a pesquisa poder viabilizar-se, a própria autora precisou “estabelecer e cultivar” guanxi, arte de relacionamento aprendida às vezes com sofrimento e abaixo de preconceitos (o clichê “mulher brasileira, jovem e com boa aparência”, na China, à procura de empresários emergentes e ricos exportadores para fazer pesquisa???), sem o que não teria acesso às empresas e às pessoas que precisava conhecer e entrevistar. Nesse aspecto cabe ressaltar sua relação com Feifei, sua tradutora, intérprete, guia e facilitadora de relações – uma personagem à parte que, por si só, já vale a leitura da obra. Foi com ela que Rosana teve de aprender como “as coisas aqui funcionam” e, mais que isso, pelo seu comportamento (sugestões, atos, ideias, práticas simbólicas pessoais e no mundo dos negócios),  intencionalmente ou não, consegue expressar ao leitor, como nos quadros de uma exposição, retratos dos modos e do estilos de vida de uma sociedade.
Finalmente, como terceiro ponto, o relato da visão dos empresários integrantes do circuito e a linha tênue entre o formal e o informal, entre o mercado “paralelo” e o “reconhecido”. “No mundo nada se cria, tudo se copia” é o título de um capítulo. Não se trata de uma economia “subterrânea”, ilegal, às escondidas. Só é falsificado o que merece ser. Como afirma um alto executivo da fábrica D&G Benetton na China: “Se um dia uma bolsa não for falsificada, aí vamos ter um problema sério”. Assim, a pirataria vira marketing, o pretensamente ilegal ganha status, o mercado acaba criando regras próprias à margem e junto com o estado. As autoridades não apenas toleram, mas incentivam; a falsificação é condenada, mas ao mesmo tempo praticada e abertamente defendida. Muitas vezes os jornais locais noticiam que o governo agirá “energicamente” contra a pirataria. Faz parte do jogo a negação, mas resta evidente sua indissociabilidade tanto da flexibilização e da terceirização das atividades, como da mundialização do circuito mercantil. Ou seja, justamente as marcas estruturais do estilo de crescimento das últimas décadas, nas quais se assentam o crescimento da China e de outros países asiáticos. Termos de conotação costumeiramente jocosa ou de carga negativa - como contrabando, pirataria e suborno - adquirem outros significados, posto que não só são tolerados, mas em certos casos, pelo que se depreende, até incentivados pelas autoridades. Ocorre na prática um arranjo muito peculiar entre mercado e estado que me ocorreu chamar de “feixes” de legalidade (e de ilegalidade), até porque essas atividades de produção e distribuição acabam influenciando significativamente o desempenho invejável das variáveis econômicas integrantes da mensuração contábil dos países, como PIB, balanço de pagamentos, arrecadação tributária e ingressos de capitais.

Made in China, portanto, traz colaboração inestimável para entendermos melhor a cultura desse país tão surpreendente e ainda misterioso para nós, que cultua a memória de Mao Tsé-Tung e pressiona diplomaticamente para ser reconhecido como economia de mercado; que oficialmente é comunista, mas lidera a produção massiva e globalizada de mercadorias e ressuscita relações de trabalho da época da Revolução Industrial; que, ao lado do ateísmo oficial, adapta o confuncionismo ao espírito capitalista, confundindo o leitor weberiano (aliás, muito bem abordado por Rosana ao tratar “Do espírito do Capitalismo Chinês”, no capítulo 4). E que está tão longe de nós geograficamente, mas, como a leitura permite perceber, tão próximo em práticas e no imaginário coletivo: o país do futuro, que quer crescer 50 anos em 5, como o Brasil sonhou no século XX, o lucro fácil e rápido do aventureiro salientado por autores como Sérgio Buarque de Holanda e Viana Moog, a simbiose público/privado, as relações pessoais a perpassarem o mundo “racional” dos negócios, o nacionalismo como ideologia do desenvolvimento, o crescimento coetâneo com o aprofundamento das desigualdades. E enquanto nos perguntamos até quando a China terá fôlego para crescer a taxas invejáveis, com inflação baixa e sem mudanças nas instituições políticas e na legislação social, tudo em plena crise internacional, o país parece não se preocupar com essas mazelas teóricas dos economistas ocidentais. Ou vai de Mao a melhor, como sugere a bem-humorada autora do livro.

E agora os dois asteriscos **:

O rolezinho é bom para pensar o Brasil

Rosana Pinheiro-Machado
(ZH/18/jan/2014, Caderno Cultura, última página, aqui)
Reações aos encontros de jovens ajudam a entender questões estruturais do país
Por que o fenômeno do rolezinho tornou-se o assunto mais falado no Brasil? Não tenho dúvidas de que é por sua capacidade de aflorar, acirrar e dividir opiniões sobre a questão de classes brasileiras somada à questão racial. Nos últimos dias, temos assistido a uma parcela da população brasileira apoiando esses jovens da periferia em seu exercício do direito de ir e vir. Mas também temos visto o oposto: uma vasta massa de pessoas de todas as camadas sociais destilar todo o seu preconceito de forma passional, nua e crua.

Tenho ocupado uma posição privilegiada para assistir a esses comentários. Escrevi um artigo chamado Etnografia do Rolezinho, que se tornou viral nos últimos dias nas redes sociais. No olho do furacão, tenho dedicado minha atenção para ler e entender essas expressões espontâneas que são fruto da facilidade da comunicação via redes sociais.

Um dos aspectos que eu levantaria nesse universo difuso de opiniões é o engajamento de pessoas da própria periferia, rejeitando os rolezinhos e manifestando seu descontentamento de forma bastante preconceituosa, uma vez que é possível que grupos que sofram discriminação possam reproduzir o preconceito sofrido como uma forma de negociar a sua condição no mundo, como um alívio para a dor – ao bater no outro, livra-se do fardo. Assim, há uma parte das camadas populares (especialmente composta por trabalhadores que possuem uma condição um pouco mais emergente) que diz: “vai trabalhar vagabundo” ou “que tal uma enxada?” (se fosse um rolezinho de mulheres, certamente a palavra seria substituída por “vassoura”). Todavia, isso é apenas uma porcentagem difícil de quantificar, mas é certo que os grupos das periferias urbanas tendem a cada vez mais apoiar o rolezinho. O grande descontentamento, na verdade, vem de camadas médias e altas, que veem a sua paz ameaçada. Entre esses setores, a verbalização se torna um pouco mais violenta: pede-se por maior policiamento e que esses jovens “tomem pau da polícia”. No entanto, essas posições não podem ser generalizadas para nenhum dos lados: há muito apoio e solidariedade vindos de todas as camadas sociais.

Não é exagero dizer que o rolezinho é tão bom para pensar o Brasil quanto os protestos de junho de 2013. Muitos jovens que ora estavam reclamando da ação policial, agora estão pedindo para que a polícia “dê porrada”. A sociedade está mais dividida hoje do que naquela ocasião. E essa polícia tende a agir para um lado dessa divisão, para manter uma ordem particular e relativa. Nunca me esqueço de um policial que entrevistei em 2005 na fronteira Brasil-Paraguai. Perguntei se ele não tinha, às vezes, pena de algum pequeno comerciante que tivesse a mercadoria apreendida. Ele me olhou fundo e disse: “A gente aprende a ter ódio, ódio generalizado, ódio a todos os vagabundos”.

O que tenho visto no Brasil nos últimos dias é ódio e medo. Medo de uma massa supostamente desordenada, incontrolável. Ódio dirigido a uma camada “vagabunda” que deveria estar trabalhando. É claro que, nessa percepção, o fato de esses jovens terem dificuldade de entrar no mercado de trabalho – por não terem adequada qualificação, por terem sido rodeados de nãos de todas as ordens – não é levado em consideração. O tema da violência estrutural é pouco debatido. Poucos querem tentar fazer o esforço de se colocar no lugar do outro: de imaginar o que é uma vida de recusa diária marcada pelo tráfico, pela falta de professores e pela falta por saúde. Poucos querem fazer o esforço de imaginar como um pobre negro é tratado em um hospital. Idealmente, a vida dos livros e do trabalho é muito louvável. Mas quantos de nós conseguimos entender o significado do que um jovem do Morro da Cruz disse a minha colega de pesquisa, dra. Lucia Scalco: “Eu não tenho dinheiro para comer. Mas gastei 500 reais em um boné”. Lucia perguntou por que, e ele respondeu: “Eu sinto que o boné é uma capa de super-herói que me protege e me empodera”.

Hoje, após a repercussão, os rolezinhos são um movimento difuso e amplo, de diversão e de política. Porém, todos eles mantêm o shopping como um lugar central. Independente da intenção, o rolezinho só faz sentido no templo do consumo, no coração da sociedade capitalista. Nada disso é novo: os grupos populares brasileiros, desde a abolição da escravatura, sempre ocuparam espaços da cidade como forma de diversão investida de política. Basta voltar às nossas produções acadêmicas clássicas, como a obra Os Bestializados, de José Murilo de Carvalho, que, por exemplo, retrata a violência do Estado para com os capoeiras no Rio de Janeiro no início do século 20. Em Porto Alegre, na década de 1940 e 1950, a prestigiosa Revista do Globo trazia frequentes matérias sobre os grupos “marginais” que tiravam a paz da população urbana que queria viver o sonho de uma cidade europeia, como comenta a historiadora Sandra Pesavento. A marginalidade tem assumido múltiplas faces na história do Brasil, mas há algo de estrutural: ela é vista como algo fora do lugar, uma massa de vagabundos. Lembro ainda da antropóloga Eunice Durham e do sociólogo Chico de Oliveira, que nos mostraram que, em nossa história, criou-se a imagem de um Brasil moderno e desenvolvido, e de um outro, arcaico e subdesenvolvido. É possível ainda acrescentar: um, branco e de elite, outro, negro nas periferias. Esses “dois Brasis” não se tocam, mas, quando isso acontece, o primeiro lado usa de suas armas mais poderosas: a força policial que varre a tudo e a todos.

Não é minha intenção dizer que os capoeiras e o rolezinho são a mesma coisa na história. Seria uma comparação simplista, pois o século 21 nos apresenta um mundo mais globalizado e interconectado. Mas há uma estrutura que se repete ciclicamente. A novidade é que hoje temos a chance de discutir de forma mais aberta, rápida, cuspindo todo o processo de discriminação engasgado. Os jovens da periferia, se estavam interessados apenas em dar um rolê, agora estão se dando conta de sua força. E não têm se contentado em ser parte daquele Brasil arcaico, que se esconde longe dos olhos da população em sua cega zona de conforto. Esses jovens querem ser vistos com sua capa de super-herói. Eles não querem ser reconhecidos por meio da exotização e da romantização da cultura popular, mas por uma apropriação singular dos símbolos mais altos do poder (as marcas) e dos espaços (os shoppings). O rolezinho é um alívio temporário capaz de transmutar exclusão em inclusão – inclusão ainda longe de ser de fato e de direito. Termos a consciência desse debate – ou fazer emergir o discurso social camuflado – é certamente o primeiro passo.
E aqui as três estrelas:
Do meu Facebook:
Em 2009, eu e minha colega e amiga, Lucia Scalco, começamos a estudar o fenômeno dos bondes de marca. Como? A gente reunia a rapaziada, descíamos o morro e íamos juntos dar um rolezinho pelo shopping – o lugar preferido desses jovens da periferia de Porto Alegre. Eles nos mostravam as marcas e lojas preferidas. Eles contavam como faziam de tudo para adquirir esses bens (descrevemos todas as possibilidades em nossos papers). Havia uma agência (no sentido de prazer de Appadurai) impressionante nesse ato de descer até o shopping. Eles não queriam assustar, porque nem imaginavam que discriminação fosse tão grande que eles pudessem assustar. Muito pelo contrário: eles faziam um ritual de se vestir, de usar as melhores marcas e estar digno a transitar pelo shopping. Uma vez um menino disse que usava as melhores roupas e marcas para ir ao shopping para ser visto como gente. Ou seja, a roupa tentava resolver uma profunda tensão da visibilidade de sua existência. Mas noutro canto, os donos da loja se assustavam e cuidavam para ver se eles não roubavam nada. Um funcionário disse à Lucia a mais honesta frase de todas (uma honestidade que corta a alma): “não adianta eles se vestirem com marca e vierem pagar com dinheiro. pobre só usa dinheiro vivo. Eles chegam aqui e a gente na hora vê que é pobre”. Eles, no entanto, acreditavam que eram os mais adorados e empoderados clientes das lojas. Um funcionário da Nike uma vez declarou para a pesquisa: “nós nos envergonhamos desse fenômeno de apropriação da nossa marca por esses marginais”. Mas eles nos diziam: “as marcas deveriam nos pagar para fazer propaganda, porque nos as amamos. Sem marca, você é um lixo”. Quando eu mostrei o Funk dos Bens Materiais em aula, uma aluna de camadas altas comentou: “quando a gente vê a figura toda montada marca estampada, já vê que é negão favelado”. Infelizmente não me surpreendeu o fato de toda a aula ter caído na risada. Esse mesmo tipo de pessoa é aquela que ainda diz que é um absurdo comprar televisão, “pobre deveria alimentar a prole” e ponto final. No programa Papai Noel dos Correios, que eu e Lúcia analisamos, uma menina  desafiava o seu destino: “kiido papai noel: eu me comportei, eu passei de ano, eu cuido da minha vó, meu pai sumiu de casa. Eu só quero uma calça da Adidas!”. Mas vocês podem concluir que cartas como essas são relegadas por meio de uma moralidade escrota: todos os pedidos de meninas e meninos de roupas de marca eram vistos como um desaforo. Que absurdo! Afinal, pobre deve pedir material escolar e bicicleta!
Eu tenho ficado quieta nesse caso do rolezinho porque este talvez seja o assunto que mais seja caro à minha sensibilidade acadêmica e política. Esse tema é justamente o que me faz me afastar de uma certa antropologia vulgar com suas interpretações do tipo “que lindo essas pessoas se apropriam das marcas e dão novos significados e agência e bla blá blá prá boi dormir”. Mas também é este tema que me aproxima ao que a antropologia tem de melhor: ouvir as pessoas. Não há uma grande diferença do rolezinho organizado e ritualizado das idas aos shoppings mais ordinárias (ainda que a ida ao shopping pelas classes populares nunca tenha sido um ato ordinário), eu vejo uma continuidade que culmina num fenômeno político que nos revela o óbvio: a segregação de classes brasileiras  que grita e sangra. O ato de ir ao shopping é um ato político: porque esses jovens estão se apropriando de coisas e espaços que a sociedade lhes nega dia a dia. Quando eu vejo aquele medo das camadas medias, lembro daquelas pessoas que se referiram “aos negões favelados”. E há certa ironia nisso. Há contestação política nesse evento, mas também há camadas muito mais profundas por trás disso.
Eu estou acompanhando os rolezinhos e sinto certo prazer em ver aquela apropriação. Mas entre apropriação e resistência há uma abismo significativo. Adorar os símbolos de poder – no caso, as marcas – dificilmente remete à ideia de resistência que tanta gente procura encontrar nesse ato. O tema é complexo não apenas porque desvela a segregação de classe brasileira, mas porque descortina a tensão da desigualdade entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, entre o Norte e o Sul. E enquanto esses símbolos globais forem venerados entre os mais fracos, a liberdade nunca será plena e a pior das dependências será eterna: a ideológica. Por isso, para entender a relação que as periferias globais tem com as marcas e os shoppings, é preciso voltar para os estudos colonialistas e pós-colonialistas. A apropriação de espaços símbolos hegemônicos, desde Mitchell até Newell, passando por Bhabha, Rouch e Ferguson, nos mostra uma permanente tensão na apropriação que tenta resolver a brutal violência que esta por trás desse ato. O meu lado otimista, não nega o que esses jovens nos disseram: do prazer que sentem em se vestir bem e circular pelo shopping para SER VISTO. Meu lado pessimista, tende a concordar com Ferguson de que há menos subversão política e mais um apelo desesperador para pertencer à ordem global. É preciso entender o rolezinho dentro de uma perceptiva do Global South de séculos de violência praticada na tentativa de produzir corpos padronizados, desejáveis e disciplinados.
O pobre no shopping repete a mimeses de Bhabha. A classe media disciplinada vê os jovens vestindo as marcas do mercado hegemônico para qual ela serve. A classe media vê os sujeitos vestindo as mesmas marcas que ela veste (ou ainda mais caras), mas não se reconhece nos jovens cujos corpos parecem precisar ser domados. A classe media não se reconhece no Outro e sente um distúrbio profundo e perturbador por isso. Não adianta não gostar de ver a periferia no shopping. Se há poesia da política do rolezinho é que ela é um ato fruto da violência estrutural (aquela que é fruto da negação dos direitos humanos e fundamentais): ela bate e volta. Toda essa violência cotidiana produzida em deboches e recusa do Outro e, claro também por meio de cacetes da polícia, voltará a assombrar quando menos se esperar.


18 janeiro, 2014

Eu e o Vestibular da UFRGS

Querido diário:

Hoje o jornal divulgou a lista de aprovados no vestibular da UFRGS, universidade que -como sabemos- abrigou minhas três aparições bem-sucedidas e algumas outras que não tiveram sucesso. No primeiro caso, economia (1968), matemática (1969) e arquitetura. No segundo, apenas a arquitetura, ou seja, fui reprovado algumas vezes, antes da aprovação em 1972. 

Mesmo antes disto, quando comecei a pensar que eu mesmo deveria submeter-me a este antipático exame, passei a olhar as listagens, procurando a existência de algum rapaz ou rapariga chamado/a Duilio ou Duilia. E cheguei a achar um e nunca uma. Este ano, não foi diferente da moda: nada achei. O mais próximo, imediatamente acima, foi Dreyfus, talvez brasileiro. E antes do Dreyfus e do Duilio ausente, havia 14 (eu disse "quatorze") Douglas. Nem um Dougla ou Duglass, mas 14 Douglas mesmo.

DdAB
P.S. E vi, uma vez, na lista de aprovados na Universidade de Caxias do Sul, uma garota de nome Doroti Malone, com sobrenome gringo e brasileiro!

Imagem: aqui, num blog superinteressante.

17 janeiro, 2014

Uma Administração Pública Profissional

Querido diário:

Na página 10 do jornal de hoje (Zero Hora), fala-se na "[...] decisão do TCE sobre o cálculo da tarifa [...]" de ônibus na cidade de Porto Alegre. Quem é TCE? É o Tribunal de Contas do Estado. E quem é MP? Ainda não tinha entrado na história. É o Ministério Público. E que tudo isto tem a ver com futuro luzidio, futuro melhor que o presente?

Precisamos definir presente: a política tornou-se uma vergonha, não sei bem em que dia começou. O fato é que havia um descontentamento com ela em 1964, o foi usado pelos militares brasileiros (nem todos, by the way) a amotinarem-se contra o poder constituído. E, quando a ditadura foi removida, surgiram os "anões do orçamento", um bando de deputados agatunados. Um deles, para lavar dinheiro, ganhou na loto dezenas de vezes, apostando com bolões caríssimos. E ontem? Maranhão, São Paulo, Rio Grande do Sul, do Norte, do mato, do grosso.

Neste vai-vem de lambanças políticas e institucionais, praticamente destruiu-se a qualidade da administração pública, especialmente por meio da proliferação de cargos de vereadores, de assessores de deputados e, principalmente, dos cargos em comissão cedidos a apaniguados políticos. Pois parece estar chegando a hora da virada. Tenho a impressão que o passo simbolicamente original deve-se à administração municipal de Porto Alegre: uma vez que aquele TCE ou o MP, um destes, desagrada-se tanto com seus critérios de cálculo da tarifa dos ônibus, o prefeito pediu a eles que informem o valor adequado.

Claro que para fazê-lo essa turma deverá começar a organizar-se e montar equipes técnicas de qualidade. Tarifa do ônibus, viabilidade econômica de uma obra, impacto ambiental de uma represa. Tudo, tudo! Talvez ainda sejamos salvos, após uma reforma política e administrativa.

DdAB
O vídeo é de Juca Chaves!

Caixinha, obrigado

A mediocridade é um fato consumado
na sociedade onde o ar é depravado
marido rico, burguesão despreocupado
que foi casado com mulher burra mas bela
o filho dela é político ou tarado
Caixinha, obrigado!

A situação do brasil vai muito mal;
Qualquer ladrão é patente nacional;
Um policial, quase sempre, é uma ilusão
E a condução é artigo racionado.
Porém, ladrão... isso tem pra todo o
Lado!
Caixinha, obrigado!

O rock'n'roll, nesta terra é uma doença,
e o futebol, é o ganha pão da imprensa
vença ou não vença, o Brasil é o maioral
e até da bola, nós já temos general
que hoje é nome de estádio municipal
Caixinha, nacional!

a medicina está desacreditada
penicilina, já é coisa superada
tem curandeiro nesta terra pra chuchu
Rio de Janeiro tá pior que Tambaú
e de outro lado, onde está o delegado
Caixinha, obrigado!

Dramalhão, reunião de deputado
é palavrão que só sai pra todo lado
Se um deputado abre a boca, é um
atentado
E a mãe de alguém é quem sofre toda vez
No fim do mês... cento e vinte de ordenado.
Caixinha, obrigado!

16 janeiro, 2014

Poder Judiciário: é candidato

Querido diário:
Este Planeta reiteradamente fala em sua campanha (uma delas...) sobre candidatos a fechamento:

.a. fechamento dos estados, organizando-se a administração territorial do país por meio de associações de municípios; com isto, ter-se-ia apenas relação de terceiro nível, digamos, entre Trancoso e Juazeiro;

.b. fechamento do senado federal: por consequência lógica - e extremamente desejável - como não haverá mais estados, acaba sua representação no congresso nacional, ou seja, fecha-se o senado federal;

.c. fechamento do poder judiciário: substituído pela empresa júnior associada ao centro acadêmico da faculdade de direito de alguma universidade europeia (costumo cogitar da Suíça, Bélgica, Noruega, e poderia seguir com outros exemplos/candidatos).

Hoje a página 22 de Zero Hora tem um quarto de seu tamanho dedicado a informar algo da vida privada do afamado ministro Joaquim Barbosa. E que temos a ver com a vida privada do rapaz? É que ele está em férias (todos os brasileiros têm ou teriam o direito de tirar férias anualmente, e até acho que estas deveriam ser aumentadas para dois ou três meses por ano, preparando a vida decente do século XXII e criando mais emprego hoje mesmo), só que -diferentemente da maioria- foi surpreendido por um convite para apresentar alguns seminários na Europa, justamente agora. E, como ninguém é de ferro para estar financiando este tipo de emergência, o jurisconsulto convidou o tribunal de justiça a pagar as 11 diárias que tomou a liberdade de requerer, totalmente ao abrigo da lei (isto é, legalíssimas).

No "programa" (aspas do Planeta), de acordo com o jornal, "[...] além das palestras, há uma série de encontros com autoridades [...]":

.a. o presidente do conselho constitucional da França
.b. a ministra da justiça francesa
.c. a associação e juízes e advogados britânicos
.d. o diretor da biblioteca britânica
.e. o presidente da ordem dos advogados da Grã-Bretanha e Gales
.f. almoço na residência do embaixador do Brasil

E, fala o jornal, tudo isto, "entre outros eventos".

Pensei: R$ 14.100 em diárias? Bão, muito bão! Seria uma emergência surgida durante as férias do rapaz? Até parece que estes seis compromissos não podem ter surgido espontaneamente, não é?, deveriam ter sido planejados com enorme antecedência, não é mesmo? E este troço é legal? Será que a lei brasileira é legal? Será que temos alguma coisa parecida com o que os países civilizados chamam de justiça? Temos mesmo é que acelerar as pressões para começar as mudanças do caput sugeridas no postagem.

DdAB
Imagem: Google. Se queres mesmo ir a Juazeiro (Bahia, estado a ser extinto de acordo com o item .a.), pelo mapa, deves mirar em Petrolina (Pernambuco, estado também a ser extinto, comme tous les autres), e parar um pouco antes de atravessar a ponte.

15 janeiro, 2014

A Indústria Brasileira: mais argumentos

Querido diário:

Anteontem postei coisas sobre a indústria brasileira, reproduzi um artigo de Luis Gonzaga Belluzzo e prometi voltar ao tema. Faço-o hoje, mesmo que ainda precise fazer outra postagem com "ainda mais argumentos" e mesmo com "e ainda mais argumentos II", etc.

Cito, para começar, uma frase que está longe de servir como evidência de alguma superioridade da indústria brasileira sobre o que quer que seja:
Além de sua permanente autodiferenciação, o sistema industrial deflagra efeitos transformadores na agricultura e nos serviços.
Ou seja, autodiferenciação é diferenciar-se de si mesmo: nada do que foi será, como nos disse, além de milhares de outros, Lulu Santos. Está bem: haverá autodiferenciação permanente, mas isto não necessariamente requer que esta indústria esteja localizada no território pátrio. Parece óbvio que a agricultura e os serviços valem-se de insumos (intermediários ou bens de capital) originários da indústria, mas insisto no ponto: não precisam ser produzidos no país.

O problema, não me canso de anunciar, não reside na importância do setor industrial em si, mas da ênfase que nele dão os formuladores das políticas públicas. O que eu digo é que mais vale um país formar cidadãos do que formar tratores. Belluzzo e seu coautor dizem algo que deixa bem claro seu ponto e, como tal, minha discordância, minha inconformidade: "[...] a escolha das cadeias [produtivas] prioritárias é de suma importância." Claro que estamos agora falando de uma escolha que não necessitaria ser exercitada, pelo menos não desta forma.


Nunca esquecendo: meu ponto não é associado àqueles brasileiros do segundo quartel do século XX que pregavam contra a indústria nacional e tão criticado por Monteiro Lobato (entre estes, os "caxambueiros", contrários à escavação de petróleo). Deixo claro que meu ponto é centrar a política de governo no sistema educacional, fazendo-o de centro de irradiação de estímulos à produção de insumos educacionais (sapatos, sanduíches, piscinas e livros). E acho que paro por aqui.

DdAB
Imagem: daqui.

12 janeiro, 2014

Hai Kai n. 46

Querido diário:

Quase que este fim-de-semana esvai-se com a ausência de minha presença com o haikai 46 e sua correspondente trova:

MILLÔR
(D'après Malherbe)
VOA-VIVE SILENCIOSA
O TEMPO DUMA MANHÃ
BREVE COMO UMA ROSA.

Planeta 23
Breve como uma rosa
É o duro e rijo granito
Nos jardins do infinito.

DdAB
Imagem: aqui.

11 janeiro, 2014

A Indústria Brasileira: argumentos

Querido diário:
A Carta Capital de número 781 tem um conteúdo central que chama de Um Plano de Governo. Nas páginas 22 a 26, há um artigo de Luis Gonzaga Belluzzo e Júlio Sérgio Gomes de Almeida. Intitulando-se "Impedir a terra arrasada", ele identifica-se com o carimbo de Política Industrial. Tenho afirmado em diversas instâncias que a ênfase dada por muitos economistas para a prioridade à indústria, quando falamos nas políticas públicas, é um erro. O artigo conduz-nos a pensar sobre o tema já em suas sentenças iniciais.

Vejamos algumas passagens e comentários:
Começamos por sustentar o ponto de vista que atribui à indústria de transformação um papel crucial e insubstituível na determinação do desempenho das economias modernas.
Naturalmente estamos falando de "um ponto de vista" e este tem recebido o tratamento na literatura da economia do desenvolvimento das chamadas "leis de Kaldor". E aí saímos da indústria de transformação e chegamos num grupo de metal-mecânica, química e eletro-eletrônica, no máximo. O problema é, digamos, econométrico: qual setor "causa" o crescimento do PIB. Serão estes que cito? Quais são os dados adequados a testar estas hipóteses?

Minha inconformidade com este ponto de vista é que, com ele, nega-se espaço à possibilidade de que -outro ponto de vista- mais valeria uma política industrial voltada à promoção da formação de capital humano do que à de capital físico. Minha retórica sustenta que um trator não faz um engenheiro, mas um engenheiro faz um trator. O problema, talvez, com minha ênfase na luta pela formação de capital humano é que, sem capital social, as prioridades não serão atribuídas a esta área. Que é capital humano? Boas escolas, boa água encanada, bons esgotos, boas casas de saúde, bons restaurantes populares, bons albergues, boas cadeias.

Pedir prioridade à indústria é levar os meios à condição de fins. Naturalmente se as prioridades voltam-se à boa educação, precisaríamos de uma indústria que produzisse os livros da biblioteca, os computadores da sala de aula, os uniformes dos alunos, as merendas, as cadeiras e mesas, o material do gabinete médico, do gabinete dentário, do gabinete de assistência social, da assistência psicológica, da caixa dágua, da piscina e seu aquecedor, do ginásio de esportes, dos ônibus escolares. É tanto linkage industrial para oferecer uma tonelada de serviços educacionais que não vejo por que precisamos começar fazendo o trator e não o engenheiro.

Aliás, os uniformes, as merendas, os ônibus nem precisam ser "nacionais" para servirem os nativos. Nativo não pode ser importado, mas roupa, comida e ônibus pode. Naturalmente o Brasil não precisa, no presente momento preocupar-se em importar comida (ainda que o façamos em proporções ditadas por conveniências diversas). Mas não vejo bem a razão que levaria os trens produzidos no território nacional por empresas gerenciadas por "capitais" estrangeiros serem especialmente melhores do que as adquiridas lá em suas matrizes. Mesmo porque, para termos bons ônibus, é muito provável que precisemos, antes da fábrica, dos trabalhadores, o que se consegue com educação (etc.) e não com a importação de trabalhadores estrangeiros.

Depois, temos o que chamo de efeito Excel: os setores produtores de bens cedem crescentemente participação ao setor serviços. Este, naturalmente, conta com insumos agrícolas (o agrião da salada ou do xarope da tosse receitado no ambulatório da escola...) e industriais (o vidro que armazena o xarope). Mas a essência de sua geração de valor reside nos serviços.

O argumento baseado na associação entre renda e emprego parece-me ser fruto de uma concepção antiga de desenvolvimento. As tecnologias modernas cada vez mais prescindem do fator humano para gerar a produção material (bens), mas tornam-se intensivas nos serviços.

Bem no início do artigo, Belluzzo e Almeida dizem:
A incansável diversificação do setor de serviços está umbilicalmente ligada à evolução tecnológica e organizacional da empresa industrial que avança na redução do tempo de trabalho socialmente necessário e na demanda de mão de obra extremamente qualificada. A incompreensão dos fatores que reconfiguram essas relações tem levado aos equívocos da "economia de serviços".
Não sei se isto é comigo! Parece que, de um lado, estão dizendo o que acabo de falar: para produzir uma cirurgia toráxica, o hospital usa raio X, bisturi, bandejas, colchões, sabidamente produtos industriais. Mas o valor gerado nem se compara ao coração novo embutido no peito do engenheiro, nem aos efeitos que uma vida mais longa deste devida àquele trazem ao bem-estar social. Claro que é mais difícil produzir um cirurgião do que um motorista! E estes equívocos da "economia de serviços" é que não sei bem o que quer dizer.

Um problema verdadeiro é o de como é que importaremos os bisturis eletrônicos se não contarmos com divisas (cambiais) para adquiri-los nos mercados internacionais. Mas outro problema é saber se o fechamento de uma economia como a chinesa no imediato pós-revolução comunista pode permitir algum avanço. O modelo de dar saída aos excedentes de desenvolvimento econômico também tem algo a dizer a respeito desta objeção sobre as fontes do financiamento das importações. Ademais, geram-se divisas importantes na exportação de serviços turísticos e mesmo educacionais (como os Estados Unidos) e médicos (lá mesmo ou Cuba).

O principal, em minha visão daquela idealização da indústria para promover o progresso tecnológico é que o importante não é a produção do tal bisturi, mas a forma como ele é usado dentro do hospital. E isto é "serviços" e não "indústria", um sistema nacional de inovação -nesta linguagem- é serviços.

Voltarei ao tema.

DdAB
Imagem: daqui.
Tudo isto aqui estava em
https://www1.fazenda.gov.br/resenhaeletronica/MostraMateria.asp?page=&cod=941251
Resenha Eletrônica
Impedir a terra arrasada
Revista Carta Capital - 06/01/2014
Economia Desde os anos 80 o País vive um processo de desindustrialização que o afastou das tendências globais e da nova dinâmica dos mercados
LUIZ GONZAGA BELLUZZO E JÚLIO SÉRGIO GOMES DE ALMEIDA
O propósito deste artigo é sugerir orientação para a política industrial do Brasil. Começamos por sustentar o ponto de vista que atribui à indústria de transformação um papel crucial e insubstituível na determinação do desempenho das economias modernas. Já tratamos neste espaço, em artigo anterior, do significado da Revolução Industrial. Vamos relembrar: "A ideia da Revolução Industrial como um momento crítico trata da constituição histórica de um sistema de produção e de relações sociais que subordina o crescimento da economia à sua capacidade de gerar renda, empregos e criar novas atividades. O surgimento da indústria como forma de produção apoiada no "sistema de maquinaria" e em fontes de energia inanimada internaliza o auto desenvolvimento do progresso técnico e impulsiona a divisão social do trabalho, engendrando diferenciações na estrutura produtiva e promovendo encadeamentos intra e intersetoriais. Além de sua permanente autodiferenciação, o sistema industrial deflagra efeitos transformadores na agricultura e nos serviços. A agricultura contemporânea, o chamado agronegócio, não é mais uma atividade "natural" e os serviços já não correspondem ao papel que cumpriam nas sociedades pré-industriais. A incansável diversificação do setor de serviços está umbilicalmente ligada à evolução tecnológica e organizacional da empresa industrial que avança na redução do tempo de trabalho socialmente necessário e na demanda de mão de obra extremamente qualificada. A incompreensão dos fatores que reconfiguram essas relações tem levado aos equívocos da "economia de serviços". O avanço da produtividade geral da economia não é imaginável sem a dominância do sistema industrial no desenvolvimento dos demais setores."

A Revolução Industrial não se esgotou nas transformações ocorridas na Inglaterra no fim do século XVIII, mas revolucionou, ao longo dos séculos XIX, XX e XXI suas próprias conquistas, ao introduzir importantes mudanças de natureza tecnológica, empresarial e organizacional, com reverberações na vida das sociedades e no redesenho da economia internacional.

Como afirmamos várias vezes em artigos anteriores, o Brasil desde os anos 80 sofre um processo de desindustrialização, com severas repercussões sobre o desempenho da economia. Na transição dos anos 70 para os 80 do século XX, o Brasil afastou-se das tendências da indústria global, ou seja, deixou de incorporar os novos setores e, portanto, as novas tecnologias da chamada Terceira Revolução Industrial. Falamos da informática, da microeletrônica, da química fina e da farmacêutica.

No mesmo passo, a organização empresarial brasileira distanciou-se das novas formações empresariais que surgiam, sobretudo, nas vibrantes economias exportadoras asiáticas, impulsionadas por agressivas políticas industriais e de exportação de manufaturados. No fim dos anos 70, a produção e a exportação de manufaturados brasileiros eram próximas ou superiores àquelas de seus concorrentes asiáticos. Hoje esses países têm posições que são um múltiplo da produção e exportação brasileiras de manufaturados.

Nos anos 80, a economia brasileira foi submetida à regressão industrial e econômica deflagrada pela crise da dívida externa e suas consequências fiscais e monetárias (enormes déficits fiscais e alta inflação com indexação generalizada). Nesse período, favorecidas pelas políticas liberais nos países desenvolvidos e pelas iniciativas domésticas de fortalecimento industrial e de exportação de manufaturados, as grandes empresas asiáticas, particularmente as coreanas, seguiram o exemplo japonês dos anos 60 e 70 e iniciaram uma escalada de internacionalização. Hoje essa estratégia é perseguida pelos chineses.

O Brasil joga na defesa desde a adoção do II PND. Esse plano de desenvolvimento combinou pesados investimentos em energia e nos setores básicos (siderurgia, metais não ferrosos, petroquímica, papel e celulose e bens de capital por encomenda). Apoiados no tripé empresa estatal, empresa estrangeira e empresa nacional, os investimentos do II PND abasteceram-se generosamente no financiamento externo, provido, então, pelos empréstimos sindicalizados dos grandes bancos comerciais internacionais.

O desastre que se seguiu à elevação da taxa de juros americana em 1979 foi de grandes proporções. A década perdida dos anos 80 foi marcada por forte restrição externa. Isso pode ser dimensionado pela queda violenta da relação importações/PIB que chegou à incrível cifra de 3%. Trata-se de um fechamento forçado da economia. A estabilização do nível geral de preços levada a cabo em meados dos anos 90 livrou a economia brasileira da hiperinflação, mas não teve forças para eliminar a herança dos malfadados anos 80. As condições em que foi realizada a estabilização custou ao Brasil uma combinação perversa entre câmbio e juros, com graves prejuízos para o crescimento e a diversificação da indústria. A crise da dívida favoreceu a ênfase nos setores criados no II PND e a substituição de importações ineficiente imposta pelo estrangulamento externo.

Em meio às rápidas e profundas transformações da economia industrial e dos padrões de concorrência no âmbito internacional, a indústria brasileira seguiu com a estrutura dos anos 70 com avanços microeconômicos aqui e acolá. Esse é o caso, por exemplo, da indústria extrativa mineral, da indústria de petróleo e derivados e da indústria aeronáutica.

A escalada industrial da China tornou nossa situação industrial ainda mais desvantajosa. A estratégia chinesa apoiou-se numa agressiva exportação de manufaturados que atinge seu ápice na segunda metade dos anos 2000.

Essa realidade, combinada com a mudança favorável nos termos de troca, acentuou as tendências que afligiram a economia industrial brasileira nos últimos 30 anos: valorização cambial, "reprimarização" da pauta de exportação, bloqueios à diversificação da estrutura industrial, permanência de uma organização empresarial defensiva e frágil. As medidas defensivas adotadas depois da crise de 2008, tais como a desoneração, o crédito favorecido, a exigência de conteúdo nacional e medidas de defesa comercial, malgrado as críticas que sofreram e ainda sofrem, foram importantes para impedir uma deterioração ainda mais profunda da indústria de transformação.

A fragilização industrial ocorre em um momento de intenso movimento de fusões e aquisições em todos os níveis das cadeias produtivas globais. Sendo assim, a política industrial não pode reproduzir as orientações do período dito nacional-desenvolvimentista e muito menos promover uma abertura comercial sem estratégia, ou seja, desamparada de uma política industrial e financeira ajustada aos tempos de hoje.

A literatura relevante sobre processos de industrialização ou de (re)industria-lização assinala a importância da ação do Estado na promoção das formas de financiamento, na educação, na criação de sistemas de inovação e nas políticas comerciais, leia-se, na abertura de oportunidades a serem capturadas pelas iniciativas do setor privado. Não é preciso lembrar ao leitor que essa foi a experiência de Alemanha, Japão, Coreia, China e, last but not least, dos Estados Unidos.

A premissa maior de uma nova política é a adoção de um câmbio competitivo, o que significa, nas condições atuais, buscar a elevação das importações como ingrediente do crescimento das exportações. Amanutenção do câmbio real competitivo é condição necessária, porém não suficiente para a constituição da nova política, mas deve ser complementada por um conjunto de ações governamentais executadas simultaneamente.

E bom notar que os críticos à esquerda haviam apontado a exaustão do chamado "modelo de substituição de importações", sublinhando, aliás, alguns desafios importantes de hoje que estavam postos em mea-dos da década dos 70: 1.A criação dos instrumentos e instituições privadas de mo-bilização do financiamento doméstico, particularmente para suportar o financiamento de longo prazo. 2. A reestruturação e modernização da grande empresa de capital nacional e de suas relações jcom o Estado. 3. A constituição do que Fernando Fanjzylber chamava de "núcleo endógeno de inovação tecnológica".

As críticas à industrialização brasileira recomendavam a adequação do tamanho e da estrutura organizacional das empresas brasileiras às condições da "competitividade global", o que favoreceria a sua internacionalização e permitiria melhorar nossa posição na celebração de acordos de comércio e investimento.

No que diz respeito ao "núcleo endógeno de inovação tecnológica", o Brasil foi bem-sucedido em três aventuras que !juntaram as políticas do Estado à iniciativa privada: a Embrapa, a Embraer e a Petrobras. Essas experiências de sucesso reproduzem, aliás, o que tem sido executado nos países desenvolvidos e, mais recentemente, na China.

Caberia agora identificar novas fronteiras de articulação público-privada com potencial para absorver inovações e transformações organizacionais. Não se trata, apenas, de buscar acréscimos marginais de avanços tecnológicos aplicados a processos e produtos. Embora isso deva ser perseguido pelas políticas, o núcleo duro deve contemplar a formação de um sistema capaz de revolucionar continuadamente os processos de produção e a oferta de novos produtos. Dessa forma, a escolha das cadeias prioritárias é de suma importância. À guisa de exemplo, cabe mencionar o elevado potencial de acumulação e de capacidade privada para suportar riscos de alguns segmentos da vida empresarial brasileira. Falamos do agronegócio, da indústria de base e da estruturação que tem sido levada a cabo na indústria de defesa. Essas indústrias possuem características que permitem a concertação de ações público-privadas voltadas para a qualificação das cadeias industriais.

É preciso reafirmar que o sucesso desses empreendimentos depende crucialmente das políticas de financiamento e incentivos públicos ao investimento e à inovação e das compras governamentais, pontos nos quais o atual governo tem avançado. Resta criar um sistema de metas e contrapartidas rigorosamente cobradas dos beneficiários privados. Uma espécie de combinação entre as políticas norte-americanas e as políticas asiáticas.

10 janeiro, 2014

Hai Kai n. 45

Querido diário:

Seguindo nas trovas que o Planeta 23 encetou com Millôr Fernandes, conforme publicado no livrinho da L&PM. Temos na p.51 o 45o. Hai-kai:

MILLÔR
PENSA O OUTRO LADO:
SÓ TEM FAMA
QUEM É DIFAMADO.

E o Planeta 23 respondeu:

É difamado
todo aquele
do outro lado.

Parece que merecemos um comentário: inteligentíssima resposta, pois torna-se claro que não difamamos os de nosso próprio lado. Se o fizéssemos, estaríamos talvez no caminho da tolerância relativamente aos do outro lado, culminando por chegar na situação ideal de não difamarmos ninguém e ninguém nos difamar. Seria mesmo um feliz 2014!

DdAB
Imagem: aqui.

09 janeiro, 2014

Encrenca Desenvolvimentista: Brasil/2014

Querido diário:
No dia 7/jan/2014 (até agora ainda não errei nenhum cheque, nenhuma vez escrevendo o novo ano), vi na TV uma notícia originária do Financial Times (não conferi na página) falando sobre o crescimento econômico brasileiro e dando dicas. Dizem que o Brasil bem poderia crescer mais do que as taxas rastejantes que lhe dão médias de longo prazo de 3,5% a. a., mas nos últimos anos, rastejamos a cerca de 2% anuais. Sabemos que, para duplicar em 10 anos, a economia precisa crescer a 7,12% a. a. Vamos chegar lá? O que precisamos para fazê-lo?

Entre outras medidas, o Financial Times repete um refrão que hoje vemos bastante festejado na imprensa local: precisamos substituir o crescimento baseado no consumo dos últimos anos por crescimento baseado no investimento. Em outras postagens já falei da falácia deste argumento: medindo o valor adicionado pela ótica da despesa final, PIB = DF = C + G + I + (X-M), consumo das famílias, consumo do governo, investimento e saldo do balanço em transações correntes.

No passado remoto, diziam-nos Conceição e Serra naquele "Além da estagnação" que a concentração da renda dos anos 1960s auxiliou o crescimento do final da década e início da década dos 1970s. Agora, dizem os arautos que estou criticando, seria o crescimento do consumo voltado às classes baixas que criou o "problema" da nova estagnação. Ou seja, houve uma redistribuiçãozinha de terceiro nível e alguns dizem que é o consumo que está travando o crescimento a taxas robustas. É cara de pau!

Com a equação da demanda final que mostrei acima, torna-se claro que para DF crescer, qualquer de seus elementos deve crescer (claro que a taxas diferentes, pois suas participações são diferentes). Seja como for, DF cresce se C cresce, se G cresce ou se I cresce. E também, claro, (X-M): e aí começam os problemas: por que não olhar mais cuidadosamente para o que o Brasil exporta e importa? Veremos superávit na balança comercial e escandalosos e persistentes déficits no balanço de serviços. E isto não vai mudar? E isto precisa de investimento? Claro!!! Especialmente investimento em formação de capital humano, não é isto?

DdAB
Imagem daqui. Tempos atrás, disseram-me que o jornal O Estado de São Paulo era o melhor do Brasil. Desesperei-me, pois não gosto do ponto de vista da direita (ainda que leia regularmente a Zero Hora), mas vim a entender que isto é verdade. E isto não o faz um jornal de esquerda, por suposto. O melhor jornal pode ser, logicamente falando, um mau jornal, não é mesmo?

P.S.: Na postagem do dia 7/jan/2014, há uma indagação do jovem economista Daniel Simões Coelho (aqui) sobre o modelo de insumo-produto. Transcrevo para cá e edito ligeiramente, a fim de facilitar a localização no motor de busca blog):
   Matriz de insumo-produto: lá no livro "Mesoeconomia", fala-se no precursor: Leontief, com um artigo de 1936. Mas lá mesmo, ele está fazendo aplicações para a economia americana e se atém à modelagem da economia fechada (isto é, com a demanda final também sendo endógena naquela função dos aij/xj). Ainda a "Mesoeconomia" exibe nas seções 4.4, 4.5 e 4.6 uma exposição razoavelmente teórica (ainda que com exemplos numéricos fictícios, a fim de facilitar a exposição e a compreensão) dos sistemas de quantidades (o mais conhecido), preços e trabalho/emprego.
   Creio que não encontrarás um texto longo que seja absolutamente "teórico" sobre a MIP,pois a parada quer mesmo é aplicação empírica. Para isto é que -talvez- Leontief superou as formulações de Marx e Walras.
   Por fim, parece-me que o maior de todos os livros teóricos que se detém no tema da MIP é o livro de Pasinetti de 1977 (também citado lá na bibliografia da "Mesoeconomia").

07 janeiro, 2014

Mais de 1.000%

Querido diário:
Temos aquela - creio - piadinha de Marx lá naquele "Manuscritos Econômicos e Filosóficos", em que ele diz algo como "nem que os preços caiam 1.000%". Obviamente, ele sabia que os preços têm queda máxima permitida de 100%. Era, digamos R$ 5,00, como R$ 5,00 é 100% de R$ 5,00, quando cai R$ 5,00 está caindo 100%, não é isto?

E que diz a página 17 de Zero Hora de hoje? Na coluna de Maria Isabel Hammes (Informe Econômico), temos a notícia:

No embalo da Copa
   Enquanto o Brasil avançou apenas 1% nas suas exportações no ano passado, a vinícola Lídio Carraro, de Bento Gonçalves [sic], andou em uma situação totalmente inversa. A receita dos negócios com o Exterior teve crescimento de 236%.
   Quase seis meses após o lançamento, na Copa das Confederações, o vinho Faces já é vendido na Europa, Ásia e América do Norte.
   Aliás, a bebida escolhida como o vinho oficial da Copa do Mundo da Fifa, foi responsável por 70% da expansão da vinícola, com alta de 185% na receita no ano passado, três vezes mais do que em 2012.

Eu pensei: "questo è il miracolo del totocalcio", pois bastou a Fifa começou a beber daqueles vinhos, o mundo começou a amar precisamente aquele vinhozinho, em detrimento dos demais drinks produzidos pela turma do sr. Lídio Carraro. E quanto teriam crescido as bebidinhas alheias à Copa do Mundo? Simplesmente mais, muito mais: 355%.

E como cheguei a estes 355? Usei a fórmula:
0,236 = 0,7 * 185 + 0,3 * R,
onde os números são os números (hehehe) e aquele R é o restante da produção de nossa vinícola hexacampeã. Então a equação se resolve para R como os afamados 355%. Pode? Os preços podem cair 100%, mas as taxas de crescimento podem ser infinitas, não é mesmo? Mas então a farra não estará declarada para o vinho da copa, mas para os demais bebíveis. Sucesso econômico, fracasso aritmético, ou o que seja.

DdAB
Imagem: aqui. Ali na imagem vemos um Vino Corvo, cujos preços não terão caído 100%, pois ainda está no mercado a preços positivos. E aqueles 355% poderiam ser rebaixados para 258%, caso trocássemos o 0,7 pelo 0,3 na equação de primeiro grau de uma incógnita acima. Ainda o resto cresce mais que o principal. Erro, meu chapa!

06 janeiro, 2014

O Supremo...

Querido diário:
Para mim, que o ano começa hoje, não há nada mais hediondo, no Brasil, do que seu poder judiciário: um estamento republicano que se apropriou de uma fração dos impostos e trata de fazê-la crescer a qualquer custo, a quaisquer custas...

Agora, para marcar o início das festividades, eles deram-se um aumento ("indexação não" será meu slogan nas próximas passeatas) de cerca de R$ 1.500. Devemos celebrar da maneira mais estapafúrdia que concebermos. É inconcebível que haja equilíbrio estável num "poder" como este que estrutura a antiga República dos Estados Unidos do Brazil.

DdAB
Imagem: aqui.