08 junho, 2013

Handbook of Latin American Studies

Querido diário:
Haverá milhares de handbooks e uma fração expressiva deles concernentes aos estudos latino-americanos. Este blog, por exemplo, é um deles, ou melhor, é um estudo latino-americano, a realidade social vista por um latino-americano sediado em Porto Alegre e com mergulhos nos ares de outras terras terráqueas.

A Latin American, Portuguese, and Spanish Division da Library of Congress dos Estados Unidos da América publica -bienal- um destes handbooks que usei amplamente (o pertinente às Social Sciences) quando ganhava a vida como pesquisador. Naturalmente, o acesso a ele era mais fácil em, digamos, Londres do que, digamos, Porto Alegre. Preparando minha tese doutoral, usei amplamente as referências lá exibidas sobre o Brazil (como sabemos, a grafia oficial utilizada na primeira constituição republicana, os Estados Unidos do Brazil).

Segue-se logicamente que graduei-me em economia em 1972 e, em 1973, foi publicado o volume 35. Se é bienal e se é 35, segue-se logicamente que a publicação pode ser que possa existir há 70 anos, naquele tempo. E agora, nem se fala: quase 100 anos! Pode? Claro que pode, o que não pode é o Brasil sofrer de subdesenvolvimento e pensar que este negócio de BRICs é algo que o coloca ao lado da China e da Índia, com aquelas taxas de crescimento estratosféricas.

Be however it may, diriam eles lá os redatores deste Handbook, vejamos os parágrafos finais (da p.218) sobre o Gigante Adormecido:

   With Brazil now well into its fifth year of ten percent growth, there is a marked shift in the literature from the earlier concentration on structural inflation and stagnation to the newly perceived concern for the employment and distributional aspects of economic growth. Well reflected are differences of opinion within Brazilian Government and intellectual community, and among economists worldwide, regarding the extent, if any, to which accelerated growth necessarily conflicts with distributional objectives, and the relative priorities of these ends. The long article by Langoni analyzing 1960 and 1970 census data is a particularly important contribution to this debate.
   Another interesting feature of the current batch of articles is the shift of attention from the import-substitution model of earlier years to the present fact of, and future possibilities for, rapid export growth. This, of course, is in response to the very rapid recent growth of Brazilian exports, particularly of manufactures. The aggressive manner in which the Brazilian Government is promoting its exports, on both the supply and demand side, will undoubtedly be reflected in publications reviewed in a later edition of the Handbook.
   The important role of the foreign entrepreneur in Brazilian development continues to be a preoccupation of the literature. The very large inflow of medium-and long-term portfolio capital -as opposed to direct investments- has not yet attracted the analysis it deserves.
   'O Brasil é o país do futuro, y sempre será (Brazil is the land of the future, and always will be)' is an adage thas has long haunted that nation's aspirations to world power status. According to the present Government, 'O futuro já chegou' (the future has already arrived)'. Much of the literature pertaining to Brazil in the rest of this decade will be devoted to evaluating this assertion and its implicatons for its own people and for the hemisphere. Comparisons of the 'Brazilian model' with other development approaches in Latin America and elsewhere are needed and inevitable.

Não há como ficar imune a uma profunda sensação de baixo-astral ao ler estas coisas. Sabemos que os anos 1970s bateram, bem por essa época, na chamada primeira crise do petróleo. A inflação, que caíra a 15% a.a., começou a subir e a indexação começou a percolar toda a economia. Entre 1973 e 2010, o PIB cresceu à taxa de 3,38% a.a. O Milagre Brasileiro ficou por conta da queda na taxa de crescimento demográfico, o que deu certo alento à renda per capita. Mas sua distribuição (da renda, índice de Gini) nunca mais retornou ao nível de 1960 (nem 40 anos depois).

O lado alegre da milicada é que, nunca antes nem depois na história deste país, o imposto de renda foi tão importante na formação da receita tributária nacional. E o lado amargo lá deles e de todos os seus sucessores civis e mistos é que o gasto público manteve-se dedicado à corrupção e distanciado da educação. BRIC? Faz-me rir!

DdAB
P.S.: Os dados macroeconômicos disponíveis em 2013 no site do IPEA levam a 10,8% a.a. E 1970/1980 já tinha baixado para 8,6% a.a. Em minha tese doutoral e no artigo de 1999 publicado na Nova Economia (não disponível na internet), achei que algo parecieo com estes 8,6% a.a., mas para a oferta total (o familiar VBP), nomeadamente, 8,7%. a.a. Esta cifra (e, claro, estes 8,6% a.a.) escondem o fato de que o crescimento do PIB (isto é, VBP-Insumos) cresceu 6,6% a.a., no dizer de Victor Bulmer-Thomas, less of a miracle. Que aconteceu? Naquele período de crescimento robusto (claro que 6,6% é infinitamente melhor do que 3,5%, não é mesmo?), intensificou-se o uso dos insumos. E eu também calculei que a produtividade do trabalho naquele período cresceu apenas 1% a.a. Quer dizer, a pasmaceira é milenar. Muito se louvou a economia brasileira por ter crescido, até certo ponto, mais do que qualquer outro país do mundo durante o século XX. (Este post scriptum foi acrescentado às 20h07min de 9/jun/2013).

Nenhum comentário: