30 setembro, 2012

De que se trata

Querido diário:
Quando há pouco a tratar, e precauções quanto a dizer bobagens, enturmo na alta filosofia. Hoje tenho uma máxima entre parêntes e outra entre chochetes:

(a enturmação está na moda novamente no Rio Grande do Sul: ou seja, empilhar alunos na mesma sala de aula, para economizar professores; alocação ótima ou loucuradas governamentais?)

[pensamento filosófico profundo: sarrabulho no lanche dos mineiros; no caso, não se trata dos nascidos no progressista estado de Minas Gerais, mas das profundezas das minas de carvão do velho País de Gales.]

DdAB
Imagem: aqui.

29 setembro, 2012

Bens de Mérito e Públicos na Sociedade Aberta

Querido diário:
No outro dia, li um comentário sobre a sociedade aberta e fiquei a pensar em como esta dá sentido a minha concepção de expansão do consumo de bens públicos e bens de mérito na sociedade concreta.

Primeiro, darei como entendido que sociedade aberta é um ambiente em que vicejam a liberdade, a democracia e um aparato encarregado da administração das coisas. Veja só como contornei as configurações expressas na Wikipedia sobre governo dos homens. Então o assunto começa.

.a. existem três instâncias fundamentais para a agregação de preferências coletivas: a comunidade, o mercado e o estado;

.b. aceitando que a liberdade humana é uma trajetória de conquista do controle de suas necessidades, caio no conceito de Maslow:

:: necessidades fisiológicas (metabólicas)
:: necessidades materiais superiores (segurança e estabilidade),
:: necessidades sociais (reconhecimento e afeição derivados de se pertencer a um grupo), e
:: necessidades superiores (evolução pessoal ligada à busca da verdade e significado da vida).

.c. aceitando que a sociedade justa rege-se pela concepção de David Harvey:

:: desigualdade intrínseca: todos têm direito ao resultado do esforço produtivo, independentemente da contribuição;
:: critério de avaliação dos bens e serviços: valorização em termos de oferta e demanda;
:: necessidade: todos têm direito a igual benefício;
:: direitos herdados: reivindicações relativas à propriedade herdada devem ser relativizadas, pois, por exemplo, o nascimento em uma família abastada pode ser atribuído apenas à sorte;
:: mérito: a remuneração associa‑se ao mérito; por exemplo, estivador e cirurgião querem maior recompensa do que ascensorista e açougueiro;
:: contribuição ao bem comum: quem mais beneficia aos outros pode clamar por mais recompensa;
:: contribuição produtiva efetiva: quem gera mais resultado ganha mais do que quem gera menos;
:: esforços e sacrifícios: quanto maior o esforço, maior a recompensa.

.d. aceitando a importância do mercado para criar incentivos (ver postagem sobre James Meade) relevantes para o crescimento da produtividade e suas duas manifestações do século XXII (ou mesmo no final do século XXI), nomeadamente,
:: renda básica para remunerar o ócio e
:: salário mínimo para remunerar o esforço produtivo.

.e. aceitando que a produção privada (indivíduos independentes livremente associados) pode levar ao melhor tipo de organização (cooperativa ou empresa privada, etc.) não precisa conflitar com a provisão pública (estado ou comunidade),

então podemos aceitar que o escopo dos bens de mérito e bens públicos pode ir-se ampliando à medida que a sociedade enriquece e a tecnologia vai oferecendo maior variedade de bens ou serviços voltados a atender velhas necessidades de maneira convencional ou inovadora e novas (recém descobertas) necessidades de maneira convencional ou inovadora.

Quero dizer: esgoto, por exemplo, é um bem público, ao passo que água é um bem de mérito. Criando um meio de evitar o desperdício, podemos pensar que uma sociedade rica (como já é o caso da brasileira) oferecerá estes dois serviços industriais de utilidade pública gratuitamente a todos os cidadãos em suas moradias. O mesmo podemos pensar da educação: já há condições, no Brasil, de que o governo ofereça educação gratuita a todos. Que dizer de iPads, iPeds, etc.? Antes de que eles se tornem gratuitos, nos dias que correm, é preciso ainda tornar gratuito o consumo de outros bens, como vestuário, alimentação saudável, cuidados calistênicos, e por aí vai.

Ao contrário: os iPads, iPeds, automóveis, perfumes, etc. é que deverão ser a fonte dos lucros extraordinários que regerão o crescimento das empresas que, de sua parte, criarão as inovações que conduzirão ao crescimento agregado da produtividade, com a invenção de novos produtos e a ampliação dos bens e serviços de provisão pública e produção comunitária ou mercantil.

DdAB
A imagem que, presumo, ilustra a literatura de cordel, com os versos de Gilberto Gil, vem daqui.

28 setembro, 2012

Ronaldinho Gaúcho e as Espaçonaves

Querido diário:
Fontes de segurança máxima informaram-me que ao alto e à direita de quem anda por certo lado do Rio de Janeiro, vê-se o apartamento de propriedade de Ronaldinho Gaúcho, que se encontra à venda (ambos?) por R$ 32 milhões de reais. Hoje em Porto Alegre, há no bairro onde moro belos apartamentos por um por cento deste valor.

Dando uma rápida olhada por aqui e por ali em sites da internet, cheguei aqui.

Lendo daqui, lendo dali, cheguei à conclusão que não será impossível, dentro de alguns anos, comprar uma nave -como lá se diz- de terceira mão, por precisamente este preço. Ou, que seja, 10 vezes mais. Jà começamos, mesmo com a tecnologia de hoje, ter nas moradias espaciais um projeto acessível.

Em outras palavras, numa antevisão já expressa por Phillip Dick no livro do caçador de andróides, os super-ricos poderemos (eba!) ter nossas naves espaciais e por elas, que navegarão pelo espaço sideral, também navegar. Jogar boliche, correr (jog) na pista externa, ter sala de musculação, biblioteca, jardim e pomar. Talvez estas amenidades elevem um tanto o preço de todo o projeto, especialmente se também jogarmos polo com cavalos de verdade, essas coisas.
DdAB
A imagem de hoje, da nave Serenity, é de conhecimento comum.

27 setembro, 2012

Bens de Mérito de Consumo Desagradável

Querido diário:
Todos sabemos que uma classificação razoável para bens e serviços divide-os em
.a. regulares
.b. de mérito
.c. de demérito.

Os regulares são mais difíceis de achar, na natureza, do que unicórnios. Por exemplo, uma ambulância do SAMU é um bem de mérito? Mesmo com motor a diesel? Mesmo se, em seu afã, atropelou uma velhinha? E a insulina?

O mesmo podemos dizer, talvez, com relação a bens de mérito e demérito. Mérito há na educação? E consumir maconha é consumir um bem de demérito?

Mas não quero filosofar mais do que o fiz sobre isto. O que desejo é salientar que, mesmo aceitando que há mérito no consumo de:
.a. estudar matemática
.b. envolver-se em educação (em geral)
.c. fazer ginástica
.d. praticar cuidados dentais
.e. e tantos outros
são bens de mérito de consumo desagradável.

Quem é que gosta de fazer ginástica e não ser declarado TOC ou viciado em endorfinas?
DdAB
P.S. os marcadores desta postagem dizem tudo...
P.S.S.: imagem: saladinha com fritura é mérito ou demérito? imagem daqui.

26 setembro, 2012

O Método e as Técnicas: o livro e a viagem

Querido diário:
Ontem foi o dia do qual foram descontados meus macluanescos 15min de fama. A profa. Brena Fernandez promoveu um coquetel de lançamento do livro

BÊRNI, D. d. A. & FERNANDEZ, B. P. M. (Org.) (2012) Métodos e técnicas de pesquisa; modelando as ciências empresariais. São Paulo: Saraiva.


que ela e eu organizamos con gusto, depois de termos recebido os originais de Antônio Marcelo Fontoura, Brena Paula Magno Fernandez, Carmen Gelinski, Cecília Schmitt, Claídes Abegg, Duilio de AvilaBêrni, Eduardo Pontual Ribeiro, Eva Yamila da Silva Catela; Helton Ricardo Ouriques, João Rogério Sanson, José Antonio Fialho Alonso, Luiz Carlos de Carvalho Jr., Magda Chagas, Pedro Alberto Barbetta,  Roberto Meurer, Soraya M. Vargas Cortes.

E a fotinho 3x4 que nos encima foi-me sacada em mau momento estético e linguístico: nervoso que só eu, tentava balbuciar o ditongo "muu" (em francês), durante um (solicitado por terceiros) discurso enaltecendo as virtudes de todos os presentes, o que fiz com tal exação que não sobrou espaço para enaltecer os estratosféricos méritos do próprio livro. Ainda assim, deixei claro que todo o projeto apenas tomou corpo, em resposta à adesão da vizinha (de blog).

A profa. Brena estava elegantaíssima, como provam fotos que ainda sairão na revista Marie Claire e outras que leio regularmente. Avisarei aqui quando isto ocorrer.
DdAB
Depois de tudo somado e multiplicado, ficou faltando uma foto dos dois organizadores (ela e eu) devidamente fardados com a camisa da seleção, ou com os trajes que ontem mesmo envergávamos.

24 setembro, 2012

James Meade (esqueçamos Ferreira Gullar)



Querido diário:
Tá aqui o resumo de James Meade que anunciei aqui:

COMPARANDO SISTEMAS ECONÔMICOS: equidade e eficiência
MEADE, J. E. (1975) The theory of labour-managed firms and of profit sharing. In: VANEK, Jaroslav. Self-management; economic liberation of man. Harmondsworth: Penguin. p.394-422. [quase que 100% literal]
A grande questão do paper é responder à pergunta: “Qual o efeito da diferentes formas de organização da produção sobre a eficiência econômica?”

[INTRODUÇÃO]
[OS SEIS SISTEMAS: Ver Tabela 1: p.398]
1. Cooperativo
2. Empresarial (entrepreneurial)
3. Cooperativo Desigualitário
4. Sociedade por ações: Joint-stock company : a company or association consisting of individuals organized to conduct a business for gain and having a joint stock of capital represented by shares owned individually by the members and transferable without the consent of the group
5. Inegalitarian Joint-Stock
6. Inegalitarian Joint-Stock Cooperative

OBJETIVOS DOS SISTEMAS
Sistema cooperativo (p.410): maximizar o lucro obtido por trabalhador
Sistema empresarial (p.410): maximizar o lucro total da firma

VARIÁVEIS DECISÓRIAS
produção, preço, investimento, emprego, etc. (p.420)

NOTA PRÉVIA:
Meade fala em trabalho alugando capital ou capital alugando trabalho (fora o Samuel Bowles que fala em empresas vendendo empregos). Na verdade estamos partindo da situação do primeiro semestre da faculdade, quando classificamos os agentes econômicos em famílias e empresas, as primeiras sendo as proprietárias dos fatores de produção e as outras sendo o locus onde se realiza a produção quando os fatores são levados a alugar seus serviços ao capitalista/empresário.

Seu vizinho Karl Marx e também todos os neo-clássicos dizem que o que é alugado são os serviços dos fatores e não os fatores propriamente ditos. E tudo se resumiria em torno da matriz de contabilidade social, que divide as organizações econômicas em produtores, fatores e instituições. Por exemplo, um equipamento de precisão não precisa ser vendido para a firma A a fim de que esta possa produzir o produto X. Tampouco um trabalhador precisa ser vendido (o que acontece com parte deles nas sociedades que têm mercado de bens, ou seja, escravos). Ao contrário, rompido o sistema feudal, o trabalhador é duplamente livre...

Ou seja, há uma certa imprecisão conceitual do Prêmio Nobel neste aspecto, mas o que é patente é que estamos falando de uma situação em que
a) os trabalhadores são livres para alugar os serviços do fator de sua propriedade
b) os capitalistas também, e são livres para alugar os serviços do trabalho (desemprego)
c) existe propriedade privada dos meios de produção.

MAIS NOTA PRÉVIA: este paper é lindo, pois mostra um método de análise (muito além da pura questão que lhe dá sustentação em termos de teoria econômica, que é a teoria neoclássica: ele define sistema econômico (empresarial e cooperativo), dizendo qual o objetivo de cada um. A partir daí, busca a racionalidade de cada um (maximizar daqui e dali). Esta interage com os objetivos de cada um: maximizar o lucro por trabalhador ou o lucro total [e qual a diferença? não é a mesma coisa?]. Depois aponta analogias entre os dois sistemas (tangenciadas aqui e ali durante o texto), mas centra o interesse nas diferenças. Estabelece cinco diferenças. Depois de analisá-las quanto a
1. curto e longo prazos [que é prazo ultra-curto, curto, longo e secular?]
2. existência ou não de barreiras à entrada e saída
3. condições de concorrência do sistema: concorrencial ou monopolístico

O Jogo de Meade:
propriedade privada dos meios de produção (inclusive o trabalho), racionalidade instrumental dos agentes (querem maximizar algo), horizonte de planejamento (a sombra do futuro: curto e longo prazo) condições de concorrência, e poder de monopólio. Constante: grau de amor/aversão ao risco
Jogo: eficiência x eqüidade. Seus resultados encontram-se na Tabela 1 da p.398:
Elevação ou redução de K e L de acordo com a desigualdade
Empresarial
Cooperativa
Cooperativa desigualitária
Sociedade por ações
Sociedade por ações desigualitária
Cooperativa por ações desigualitária
Px(X/K) ><
iPk
iPk
iPk
(PxX –
WL)/K
rPk
rPk
Px(X/L) ><
W
(PxX –
i[PkK])/L
Eo
W
W
Eo

Transposta:
Elevação ou redução de K e L de acordo com a desigualdade
Px(X/K) ><
Px(X/L) ><
Empresarial
iPk
W
Cooperativa
iPk
(PxX – i(PkK])/L
Cooperativa desigualitária
iPk
Eo
Sociedade por ações
(PxX – WL)/K
W
Sociedade por ações desigualitária
rPk
W
Cooperativa por ações desigualitária
rPk
Eo

X é o produto produzido pelo sistema
i é a taxa de juros de mercado
Pk é o preço do bem de capital
K é o bem de capital itself
...
E measures the average earnings available outside the partnership (p.415)
r é ...

Regra para contratar mais K ou L: se o PFMgK ou PFMgL é maior que o inscrito na célula, então o sistema que dá nome à coluna é viável.

[SEÇÃO ZERO de Meade]
:: A grande questão do paper é responder à pergunta: “Qual o efeito da diferentes formas de organização da produção sobre a eficiência econômica?”

[cabe lembrarmos: que é eficiência?
:: três dimensões: produtiva, alocativa, distributiva 
:: que é eqüidade?
:: não retenção monopolística de ganhos de produtividade
:: que é produtividade?
:: produzir o mesmo com menos recursos
:: produzir mais com os mesmos recursos
:: três atributos desejáveis das diferentes sociedades:
:: dinamismo
:: igualitarismo
:: estabilidade
 :::: terá o Bronfenbrenner no artigo de metodologia algo?
Cruzando:


Dinamismo
Igua-
lita-
rismo

Mais
Menos
Mais
Coréia
Argentina
Menos
Brasil/1970
Bolívia
         Fernando Fajzylber; Frances Stewart
Fecha Parênteses:]

p.421: implicações de:
:: associações de trabalhadores
:: estrutura de distribuição de lucros

Tese do artigo: p.421:
:: a política governamental torna-se necessária para superar “a tendência natural do capital amante do risco a contratar o trabalho, ao invés de o trabalho amante do risco contratar capital.”

“Muitas das características essenciais do contraste entre os dois sistemas não são basicamente afetadas pela questão de se os recursos de capital da comunidade são de propriedade privada ou são socializados e de propriedade estatal.”

:: Uma delas: que ocorreria se os trabalhadores alugassem o capital e não tivessem os serviços de seus fatores alugados pelo capital?

:: Book review do Prof. Vanek + Ward + Domar
:::::: que trabalham com a theory of the labour managed economy [Perroni, isto é contigo]

:: Aqui, vamos investigar (com Vanek) “as propriedades de um sistema em que os trabalhadores se associam e formam coletivos ou associações, a fim de operar firmas:
a) alugam capital
b) compram insumos
c) vendem produtos
:: com os melhores preços:: min de b) e max de c)
d) “they themselves bear the risk of any unexpected gain or loss and distribute the resulting surplus among themselves”

:: O Excedente é Distribuído Igualmente, de modo independente de “grade or skill”
:::::: objetivo da firma: maximizar o retorno por trabalhador
:: Meade chama a este sistema de cooperativo

:: Assim, há dois casos puros:
:::::: cooperativismo e
:::::: sistema empresarial (entrepreneurial): em que o empresário aluga os serviços dos demais fatores, compra insumos e vende seu produto aos preços de mercado, procurando maximizar
p = RT - CT
:: ou seja, se dermos prosseguimento à Teoria do Estado de Alfa Microeconômico, podemos pensar que
0 </  a </ 1
:::::: quando
a = 1: cooperativismo
a = 0: livre empresa

Muitas das características essenciais do contraste entre os dois sistemas basicamente não são afetadas pela questão sobre se os recursos de capital da comunidade são de propriedade privada ou socializados e de propriedade estatal. No caso de uma cooperativa, os trabalhadores podem estar alugando  seus recursos de capital seja num mercado de capitais competitivo alimentado pelas poupanças privadas seja de uma organização governamental central que empresta o capital estatal a certas remunerações que devem equilibrar (clear) os mercados.

As características contrastantes do sistema empresarial são igualmente bem retratadas por um sistema em que os gerentes das plantas socializadas recebem instruções de arrendar insumos e vender produtos a determinados preços, os gerentes operando de forma a maximizar o retorno total de sua planta e o estado estabelecendo os preços de sorte a equilibrar (clear) os mercados.
[Ponto 7: equilíbrio geral: dá de fazer isto? Lange x Lerner]
[E as funções do sistema de preços: informação, provisão, incentivo]


SEÇÃO DOIS: Comparação direta entre os dois sistemas:: cinco diferenças

Primeira Diferença: Incentivos [ao Trabalho]
Um trabalhador contratado por determinado salário por hora pela firma empresarial deverá observar o padrão mínimo de esforço , a fim de manter seu emprego
Mesmo que ele seja orgulhoso de seu trabalho, toda a contribuição que ele der para elevar o excedente será de propriedade do empresário (ainda que este possa querer redistribuir)

No extremo oposto, podemos pensar na cooperativa constituída por um único indivíduo
Neste caso, ele vai decidir-se a trabalhar comparando sua renda monetária e seus níveis de lazer, inclusive utilizando equipamentos que poderão comprometer a rentabilidade
Qualquer idéia inovadora poderá ser imediatamente implementada e ele receberá todo os benefício dela resultante
O problema é que existem economias de escala que a empresa de um único trabalhador não poderá apropriar-se

Numa cooperativa de n trabalhadores, o trabalhador individual que participa dos lucros com seus companheiros ainda receberá algum benefício direto de lucros adicionais devidos a seu próprio esforço, mas ele receberá apenas um ene-avos dos resultados de seu esforço

Deste modo: caso seja necessário que n se torne grande, a fim de que os benefícios do tamanho avultado sejam capturados, então as vantagens diretas na criação de incentivos financeiros pela cooperativa comparativamente à firma empresarial devem ser pequenos

Mas mesmo neste caso o sentimento de participação poderá ser maior e portanto oferecer motivação social mais forte a fim de que ele faça o melhor possível para a firma como um todo, i.e., para toda a sociedade que existe entre si e seus colegas. Este ponto deve ser estudado por outros profissionais (psicólogos, sociólogos, ...)

Sob o ponto de vista econômico, pode-se sugerir que a escala mais eficiente para uma cooperativa deve ser menor do que para a firma empresarial, uma vez que na primeira mas não na última uma redução no número de trabalhadores eleva os incentivos para uma redução nos incentivos para a eficiência do trabalhador individual

Semelhanças:
se abstrairmos estas diferenças sobre os incentivos e também as diferenças devidas aos efeitos do risco, pode-se provar que tanto o sistema cooperativo quanto o empresarial levam à mesma situação de equilíbrio num ótimo de Pareto no longo prazo, uma vez que haja perfeita mobilidade de fatores, inclusive livre entrada e saída de firmas, e que nenhuma firma poderá afetar substantivamente o preço de mercado

Mas as diferenças se manterão se considerarmos
1. curto prazo
2. existência de barreiras à entrada e saída
3. condições monopolísticas

1. Curto prazo, numa firma com apenas dois insumos: um trabalhador homogêneo com determinada jornada de trabalho com dada intensidade e um capital K fixo associados com uma função de produção X = X(L,K)
Sejam: Px o preço de uma unidade de X e W a taxa de salário de mercado vigente no setor empresarial
Se o preço de um bem de capital é Pk  se i é a taxa de juros de mercado, então iPk é o aluguel

Na firma empresarial,
o trabalho será contratado sempre que
Px(X/L) > W  :: quanto maior a produtividade do trabalho, mais trabalhadores
e o capital será contratado sempre que
Px(X/K) > iPk  ::  quanto maior a produtividade do capital, menos trabalhadores

Ingresso de mais um trabalhador na cooperativa:
:: ele será aceito, uma vez que estará aumentando o produto em
D$: Px(X/L)
e receberá a mesma participação no excedente que todos os sócios:
(RT – CT)/L = (PxX – i[PkK])/L
Assim, se
Px(X/L) > (PxX – i[PkK])/L
então haverá interesse em ir expandindo o número de sócios, até que esta relação se equalize

Agora fica fácil de ver por que os dois sistemas levam aos mesmos resultados no longo prazo quando não há: nem barreiras à entrada e saída nem condições monopolísticas de oferta

A respeito do capital: em ambos os casos, ele é atraído de pontos em que o valor de seu produto marginal é baixo para os altos, em virtude da ação de um processo competitivo em que
a) o gerente estará tentando maximizar o lucro que pertence
ou ao empresário ou ao estado
b) a cooperativa estará tentando maximizar o excedente a ser distribuído entre os sócios

A respeito do trabalho:
na firma empresarial, o mesmo processo competitivo vai atrair o trabalho em atividades em que seu produto marginal é maior
na cooperativa, o processo é diferente, mas o resultado final é o mesmo:
primeiro: em cada cooperativa, o trabalho será atraído até que o valor de seu produto marginal iguale o ganho médio dos atuais trabalhadores
segundo: se, como resultado disto, os ganhos médios são maiores em uma indústria do que em outra, os trabalhadores serão atraídos das cooperativas das indústrias com menores ganhos, a fim de criar novas cooperativas nas indústrias de maiores rendimentos

:: a produção e o preço do produto com maiores ganhos vai subir e a produção e preço do produto com menores ganhos vai cair até que o valor do produto marginal do trabalho seja equalizado entre todas as indústrias

Segunda Diferença: ajustamento a curto prazo
No curto prazo, o processo de ajustamento será diferente
Vamos considerar que o capital tem determinado montante em cada firma, no curto prazo, e que o número de trabalhadores é variável.

Vamos considerar que o preço de demanda por um produto particular x suba e os outros permanecem

No sistema empresarial, o trabalho será atraído para a indústria produtora de X, pois o valor do produto físico marginal do trabalho agora é maior na produção de X

:: Este é um processo de ajustamento que leva a um ótimo de Pareto

Mas a curto prazo no sistema cooperativo o nível de emprego vai ser reduzido e não aumentado

Aumentos no preço de X devem elevar tanto o valor do produto marginal do trabalho quanto os rendimentos por trabalhador na indústria produtora de X

Mas também vai elevar o valor do produto físico marginal menos do que os rendimentos médios e portanto isto implica que o valor do rendimento médio poderia ser elevado com a demissão de trabalhadores:
Suponhamos
Px = $1, X/L = 1, X = 100, i(PkK) = $50 e L = 50
Então, VPMgL = Px(X/L) = $1 e PMdL = [PxX – i(PkK)]/L = ($100 - $50)/50 = $1
Se Px sobe para $1,1, Px(X/L) sobe para $1,1, mas [PxX – i(PkK)]/L sobe para
($110 - $50)/50 = $1,2

Ver Figura 1

Ou seja, se as regras da cooperativa permitem a demissão de um trabalhador se houver vantagem para os remanescentes, haverá prejuízo para o demitido: this would be highly perverse and inefficient
Inefficient: no sentido de otimalidade de Pareto, pois para se alcançar um ótimo de Pareto o que deve acontecer é um aumento no emprego, no curto prazo, e não sua demissão, pois este estaria perdendo sua utilização mais valiosa

Ademais, não haveria qualquer mecanismo induzindo os atuais sócios a tomarem medidas positivas no sentido de admitir novos sócios quando o preço de venda de seu produto sobe e em conseqüência vale mais a pena  para cada atual sócio reduzir e não aumentar o tamanho da sociedade (cooperativa)

Este resultado surpreendente se deve à suposição de que há apenas um produto X. Caso sejam produzidos X e Y e os insumos sejam L e M-matérias primas, então estes resultados se modificam

Agora, se o preço de X sobe, então a cooperativa pode reduzir a produção de Y agora menos rentável para o mais rentável X

Se X e Y são substitutos próximos no programa de produção da firma, então a elevação no preço de X pode elevar sua produção, mesmo com a possibilidade de reduzir o nível absoluto de emprego (i.e., sócios)
[Henrique: e se houver economias de escopo?]

Mas, dadas várias condições, a firma de múltiplos produtos e múltiplos fatores também vai responder a aumento do preço de um de seus produtos com o aumento da produção

Diferença 3: a importância da livre entrada / saída
A pressão competitiva devida à livre entrada assume um papel mais importante no sistema de cooperativas comparativamente ao sistema empresarial

A livre entrada envolve trabalhadores desempregados como resultado da contração das firmas na indústria produtora de X reunindo-se com os trabalhadores empregados em outras indústrias que estejam recebendo menos do que os trabalhadores da indústria produtora de X e criando novas firmas produzindo X

Diferença 4: comportamento monopolístico
Sendo o lucro monopolístico dado por
M = PxX – iPkK – WL
dividindo tudo por L temos
M/L = (PxX – iPkK)/L – W
Com W constante, uma pequena redução em L provoca elevação do lucro por trabalhador no sistema cooperativo. Ou seja, numa situação monopolística, a cooperativa vai produzir menos do que a firma empresarial.

Com retornos constantes de escala, sempre haverá incentivo para a cooperativa reduzir a produção a fim de elevar seu excedente por trabalhador. Ou seja, a fim de maximizar o excedente por unidade de trabalho, sempre haverá  situações monopolísticas em que haverá incentivo para a cooperativa reduzir sua produção em presença de economias de escala.

Em outras palavras, sob condições de concorrência monopolística, cada cooperativa tenderá a sr menor do que a correspondente firma empresarial, mas haverá mais cooperativas do que firmas competitivas, ceteris paribus, ou seja, a economia das cooperativas será mais competitiva do que a das firmas empresariais

Diferença 5: efeitos macroeconômicos
Flutuações na demanda nominal total por bens causará maior flutuação de preços no sistema cooperativo comparativamente ao sistema das firmas empresariais

O desemprego também poderá existir no sistema cooperativo. E, em existindo, sua cura deve ser encontrada nas políticas estruturais de longo prazo destinadas a promover a instituição de novas firmas pelos desempregados, a fim de ajudá-los em seu desejo de aproveitar os ganhos médios de um trabalhador empregado no setor empresarial do que a caridade do seguro desemprego
[precisely the opposite of my recipee: 20 milhões de empregos no serviço municipal]

Por aqui, existe uma diferença fundamental entre os dois sistemas:
Suponhamos que ocorra uma elevação na demanda efetiva

Numa firma empresarial, haverá elevação da produção e do emprego, contemplando elevação no valor do produto marginal do capital nas empresas instaladas, o que as faz (dados os juros mantidos constantes) pensar em encomendar novos bens de capital

No sistema cooperativo, não haverá elevação no emprego e, portanto, nenhum acréscimo no produto físico marginal do capital. Na verdade, em casos em que os trabalhadores podem ser demitidos das cooperativas em que são sócios e com retornos constantes de escala, o emprego e a produção seriam reduzidos até que o valor do produto marginal do capital fosse igualado a seu aluguel: não incentivo para que as empresas cooperativas investissem em resposta a aumentos na demanda agregada

Mas que perverso universo é este em que vivemos!
a) no sistema empresarial, quedas na demanda efetiva reduzem o emprego, o qual reduz a produtividade marginal do capital, o que reduz o investimento, o que reduz a demanda efetiva, o que reduz o emprego: um círculo vicioso de feedbacks positivos
b) no sistema cooperativo, elevações na demanda efetiva reduzem o emprego que eleva o desemprego, que eleva o investimento para a abertura de novas firmas que elevam a demanda efetiva que eleva o desemprego, outro círculo vicioso de feedbacks positivos

Então precisamos comparar as condições de estabilidade dos dois sistemas, o que o Prof. Vanek faz, mas fica a conclusão de face no sentido de que o diabo parece vencer qualquer que seja o arranjo institucional adotado.

SEÇÃO TRÊS
Vamos agora considerar quais são as características institucionais básicas que dão origem a estas diferenças no funcionamento dos dois sistemas.

Pode ser que estas se devam
ou ao fato de a cooperativa querer maximizar o lucro por trabalhador e a empresa, o lucro total
ou ao fato de que na cooperativa é o trabalho que aluga o capital

Consideraremos os demais casos contidos na Tabela 1 da p.398

SOCIEDADE POR AÇÕES
Objetivo: maximizar o rendimento por ação

Este sistema é o completo análogo da cooperativa, exceto pela circunstância de que o fator fixo a curto prazo (nomeadamente, o capital) é que aluga o trabalho

Diferença 1
E também é análogo ao sistema empresarial, uma vez que ambos alugam o trabalho a determinada taxa de salário e instruem os trabalhadores sobre o que fazer no processo produtivo

Considerando que
na sociedade por ações o objetivo é maximizar o lucro por ação
[observemos a simetria com a cooperativa: maximizar o lucro por unidade do fator variável e não do fator fixo, como na sociedade por ações]

na sociedade empresarial o objetivo é maximizar o lucro total

no curto prazo, o estoque de capital é fixo,

[é de interesse notar que]
os resultados alcançados pelo dois sistemas sejam os mesmos (ver Tabela 1: p.398)

 Diferenças 2, 3 e 5
Curto prazo:
a sociedade por ações e o sistema empresarial levam aos mesmos resultados mas contrastam com o sistema cooperativo

Diferença 4
Poder de monopólio:
a sociedade por ações é muito similar a uma cooperativa:
querem maximizar o excedente por unidade de insumo, por contraste ao excedente total

Da p.413:
A sociedade por ações desigualitária: acionistas não participam da sociedade conforme o montante de recursos que carrearam a ela: os sócios iniciais podem decidir as condições sob as quais os novos acionistas podem ingressar na sociedade

SEÇÃO CINCO
Veremos agora algumas das regras apropriadas para o funcionamento de todas as formas de cooperativas de trabalho

Regra 1: a fim de oferecer alguma segurança aos proprietários do capital que o emprestam a uma cooperativa, é necessária a criação de regulamentações sobre o uso de seu capital pela cooperativa

Regra 2: o ingresso de novos trabalhadores na cooperativa deve:
a) originar-se de trabalhador que efetivamente queira ingressar na cooperativa
b) que os sócios originais queiram aceitá-lo

Regra 3: duas condições análogas para a saída de algum sócio:
a) que ele efetivamente queira sair (não seja expulso)
b) que ele obtenha permissão para fazê-lo por parte dos demais sócios [para evitar comportamento oportunístico]

SEÇÃO SEIS
As ações correspondentes aos sócios individuais não são necessariamente as mesmas:
:: elas podem ser distribuídas em diferentes proporções a sócios com
:::::: diferentes habilidades
:::::: diferentes graus de treinamentos
:::::: diferentes tempos de participação na sociedade

SEÇÃO SETE
There is no reason why one should not go the whole hog in participation and profit-sharing and apply the same principle both to those who suppy the capital and to those who suppy the labour.

:: discute
Inegalitarian joint-stock: as far as the supply of capital is was concerned
Inegatitarian cooperative: as far as the supply of labour was concerned

S: number of shares issued to those who have subscribed capital
L, M e N: três tipos de trabalho relativamente ao grau de habilidades

Se o objetivo dos atuais sócios é maximizar o retorno por ação:
a = PxX/(S+L+M+N)
então isto será realizado quando as seguintes regras forem obedecidas (which are summarized i column 7 of the table on p.398)

Reductions in L, M and N must be associated, as far as is necessary, with bargains by which existing partners buy their way out or are bribed by the remaining partners to withdraw

Aumento ou redução de S e assim de K quando
Px(X/K) >< rPk
Aumento ou redução de L e assim de K quando
Px(X/L) >< EoL
Aumento ou redução de M e assim de K quando
Px(X/K) >< EoM
Aumento ou redução de N e assim de K quando
Px(X/K) >< EoN

E milhares de outras combinações são possíveis:
e.g., alguns capitalistas e alguns trabalhadores podem reunir-se e criar uma sociedade (sob os princípios da sociedade por ações e da cooperativa desigualitária) etc.

SEÇÃO OITO
Coisas que ficaram de fora:
risco: se a cooperativa iria reagir de modo diferente do sistema empresarial quando defrontada com determinado conjunto de riscos

managerial capitalism (mas Vanek acha que teria menos gigantismo nas cooperativas)
[e o gigantismo é bom? economias de escala x concentração de poder]

Políticas governamentais:
First, the effective workings of labour partnerships will depend very much upon easy conditions for the formation of new partnerships to enter any profitable industry [o que cheira à] propriedade socialista dos principais recursos de capital da comunidade, como na Iugoslávia

Second, the labour partnership presents in its own special form a conflict between efficiency and equality. Some compromise rules on the distribution of the surpçlus among new and old workers must be found which does not introduce excessive inequalities on the one hand or excessive inefficiencies on the other

Third, thought must be given to the extent to which labour partnerships involve workers risking all their eggs in one basket. Some compromise between the degree of participation and the degree of the spreading of risks would have to be sought.
 
É, parece que a encrenca ficou enorme, mesmo.
DdAB
Imagem: aqui.