12 maio, 2010

Autoritarismo e Falsa consciência

querido blog:
parece que foi ontem, que comecei com a postagem 1 deste blog. foram tantas outras em tantos outros. parece que foi ontem que comemorei a postagem n. 365, um ano de lutas em quase dois anos de blog. a postagem 400 suscitou um comentário entusiasmado por MdPB, o que coincidiu com outras reflexões minhas sobre lobos e cordeiros.

primeiro temos que eliminar o problema causado pelos "comitês de defesa da revolução", temos que ter um estado organizado como importante instância da agregação de preferências individuais, sem nenhum grau de prioridade sobre as outras duas mais importantes, nomeadamente, a comunidade e o mercado. ninguém sabe o começo, mas sou levado a crer que veio a horda, depois a gens, aquelas coisas de Morgan (?) e Engels, depois a família, a exogamia, a troca de mercadorias e apenas aí, o estado. mas não podemos confiar neste tipo de linearidade para dar garantias absolutas da evolução institucional do homem primitivo.

o comitê de defesa da revolução é uma idéia boa, tanto é que Machado de Assis falava em "inspetor de quarteirão" em um de seus contos selecionados e publicados pela Companhia das Letras. o inspetor machadiano ajudou a salvar uma pessoa, algo assim. mas, se pensarmos que ele começaria (o que não fez) a denunciar quem abrigava escravos fujões, essas coisas, já começaríamos a corar de medo do poder deste indivíduo com relação a seus co-irmãos.

no outro dia, fiquei sabendo que o Ministério Público do Trabalho é nova organização governamental (R$ 27.000 mensais?) que zela pela erradicação do trabalho infantil, inclusive o doméstico. e que, como não pode invadir as casas, pede que a macacada denuncie seus vizinhos suspeitos de forçaram a criançada a trabalhos forçados. pensei em deixar de obrigar minha futura netinha a escovar os dentes, a amarrar os belos sapatinhos, arrumar sua caminha. e que tal se quisermos obrigá-la a rachar lenha e dar bomba na caixa dágua? e se quisermos que ela seja manobrista do sagrado automóvel da família? temos o Ministério Púbico do Trabalho para defendê-la dos cadarços e do cheirinho de gasolina, não é mesmo?

claro que o tema é complicado, e o erro mesmo é querer que os rapazes dos R$ 27.000 mensais cuidem dos cuidados que dedicarei a meus entes queridos. e a pedofilia (nada estou falando sobre religião...)? o incesto? a periculosidade de certas tarefas domésticas? onde é que estão os limites dos controles sociais, a bem da garantia de liberdades individuais? onde estão os limites entre os controles legítimos, em benefício de indivíduos discriminados e a ação autoritária? eu acho mesmo que é na redução do índice de Gini (e equivalentes), no empowerment lá do Amartya Sen, da education, education, education do Mr. Blair, essas coisas.

e que dizer da vítima aquiescente? digo aqui, para finalizar a comemoração desta quadricentésima primeira postagem, que também aprendi afoitamente a validade argumentativa do conceito de falsa consciência. claro que serei autoritário ao condenar as famílias africanas (só na África?) que se dedicam à infibulação, odeio o relativismo cultural. e quem é que garante que meus julgamentos inclusive sobre o relativismo cultural são importantes e deveriam ser decisivos (ainda que não se associando ao poder do "ditador benévolo" lá de Kenneth Arrow)?

pois acho que é o experimento contrafactual. por exemplo, desejo remover o tubo de cola da mão de um menino de rua. então imagino que fiz a operação, que o menino de rua vivenciou a nova situação de seu banhozinho diário, seus sapatos amarradinhos, uma disneilandiazinha, sorvetinhos, parquinhos, livrinhos cheirosinhos, tudo por um prazo hábil. então voltaria a ameaçar jogá-lo ao tubo de cola e sua antiga rua. depois da ameaça, peço que ele escolha entre o prospecto da manutenção do status quo (digamos, a vida na Aldeia SOS) e a volta à ruas. se um observador independente entender que ele preferiria o status quo, diremos que a remoção do menino à rua significa ampliar-lhe e não reduzir a liberdade.

e o comitê de defesa da revolução volta a atacar: se ele escolher o crack, a cola, o roubo da carteira de a velhinhos blogueiros, sou de opinião que deveremos considerá-lo criança, criminoso ou louco e não levar em conta sua manifestação de preferências...

DdAB
captura da imagem:
http://br.hsmglobal.com/notas/54957-a-falsa-consciencia-ecologica