23 novembro, 2008

A Carta que Conta

Querido Blog Dominical:
(Se é que as multinacionais não vão fazer-me postar este post com data de sábado; seja como for, a ilustração de hoje é uma obra de arte feita por mim a partir da capa de uma revista Economist já deste século)
Não é mau comparar minha leitura semanal da -penso- melhor revista brasileira com a melhor revista mundial, no sentido de voltarem-se a economia & política. Para John Lennon, ou melhor, há uma canção de Lennon, "happiness is a warm gun". Para Simone (ou Liana?) de Moraes Moreira, "felicidade é uma casinha pequenina". Seja como for, Carta Capital citou Economist e não posso deixar de lembrar -idéia fixa- Zero Hora. Vamos às letras: o que segue...
"É um resumo adequado das prioridades da plataforma de campanha democrata [Obama etc.] e começa relutantemente a ser aceita por The Economist, porta-voz da intelligentsia liberal anglo-saxônica. Mas a revista, teimosamente, agarra-se a uma tese curiosa: 'Estímulo à economia pelo gasto estatal, sim, combater a mudança climática, sim, subsidiar energia renovável, não.' Usando a mesma analogia da revista com os anos 30, é como apoiar os gastos estatais de Roosevelt e a guerra ao Eixo, mas se opor ao subsídio estatal à indústria, aos transportes, à energia e à pesquisa científica e tecnológica que venceram a guerra e restauraram o pleno emprego."
Claro que leio Carta Capital à falta de coisa melhor para enfiar os olhos. Zero Hora marca -a meu ver e ao de Bia Dornelles- aquilo que ela própria pensa ser a visão de um local sobre o mundo. E claro que o local DdAB pensa que Zero Hora não sabe lá 100% escolher o que é melhor para DdAB olhar do mundo. Por exemplo, achei mais importante do que ela/ZH a notícia da astronauta que perdeu a bolsa durante uma caminhada estelar. Nem vi na Zero e deleitei-me ao ler a notícia no semanário Elsewhere, ainda não lançado, infelizmente. O mesmo pode ser dito de Carta Capital: quer que eu veja o mundo com o olhar que lhe convém transmitir a um sampaulino ou qualquer paulista, mas acho mais mesmo sampaulino. Ainda assim, até Jaguari poderá aparecer por lá, em matéria de Phydia de Ataíde o.s.l.t..
Só que agora o trecho que citei é de Antonio Luiz M. Costa (p.42-43 do número 522, de 19/nov/2008). Então: o que é felicidade? É pleno emprego? Nunca, nunca de núncaras, houve ou haverá pleno emprego! Inclusive porque há gente que prefere não reter trabalho remunerado, ter um padrão de vida menor, mas não deixar-se prender pelas cadeias da relação hierárquica. E por que digo que nunca houve pleno emprego, além disto? Porque é verdade inarredável que sempre houve e sempre haverá excedentes de oferta no mercado de trabalho. Há duas afirmações preocupantes este artigo:
.a. que "subsidiar energia renovável" é malevo e
.b. "[o] subsídio estatal à indústria, aos transportes, à energia e à pesquisa científica e tecnológica [...] venceram a guerra e restauraram o pleno emprego".
Como resultado do estudo feito, sempre achei que qualquer subsídio é malevo. Depois que estudei o silogismo clássico, pensei:
M: todo subsídio é malevo
m: ora, subsidiar energia renovável é simplesmente subsidiar
C: logo subsidiar energia renovável é malevo.
[onde M é a premissa maior, m é a premissa menor e C é a conclusão, o que dá um silogisminho tipo Barbara muito maneiro]
Por que seriam os subsídios malevos? Porque distorcerem o sistema de preços. Mentira: não são malevos por isto, pois a sociedade deve sinalizar com incentivos materiais seu aplauso à produção de bens de mérito. Mas ela pode apresentar tal sinalização por meio de isenções de impostos indiretos inseridos no Orçamento Público. Neste caso, é mais fácil desativar os grupos de pressão para aumento do subsídio, bem como toda a corrupção que esta prática de gerar incentivos induz, mesmo em países habitados por políticos decentes. Ou seja, mesmo em outros países! Como fazer? Coloca um imposto indireto único (ou seja, tenha-se apenas um imposto indireto distribuível aos municípios, estados e governo central e não milhares de impostinhos indiretões, com isenções para bens de mérito e acréscimos para os bens de demérito).
O subsídio estatal salvou os Estados Unidos do nazismo? Gerou pleno emprego? Parece-me completamente fora de questão! Resposta: rotundo, robusto, redondo "Não!". Não, não gerou, não! Nunca houve pleno emprego. Nem os subsídios citados venceram a II Guerra Mundial. Quem financiou mesmo a guerra americana foram os impostos (de renda) ainda remanescentes do combate à Grande Depressão.
Aos neocons denunciados pela Carta Capital, anteponho os neodes, os nacional-desenvolvimentistas que não entendem que:
.a. a produção deve ser realizada localmente (como não poderia deixar de ser)
but
.b. a distribuição deve ser realizada globalmente (no Brasil, R$ 1.000 por indivíduo economicamente ativo de estipêndio de renda básica consome apenas 40% do PIB).
Como resolver o problema do desemprego (conceito convencional: neguinho não está atraído ao mercado de trabalho por salários inferiores a R$ 1.000)? Aumenta o salário de mercado, abre mão de maior fração dos 60% ainda não distribuídos e que estariam sendo embolsados pelo neguinho que pagou o salário zero. Tu entendeu, né? Se todos ganham R$ 1.000 por mês, podemos pensar que milhões (dos 80 milhões hoje em idade ativa no Brazil) abdicarão da condição de trabalhadores assalariados. E como torná-los dispostos a abdicar de abdicar? Alguns deles, mais esfaimados, ingressarão no mercado de trabalho de modo ativo se a empresa pagar R$ 1,00, outros entusiasmar-se-ão com R$ 2,00, e assim por diante.
Como resolver o problema da indústria? Não me parece haver problema na indústria que requeira atenção de governantes. E o problema dos transportes? O estado não deveria prover vias públicas, e apenas elas? Estado deve fazer vagões de trem ou dormentes (além de governantes do sono eterno e mão ligeira)? E a pesquisa científica? Comprar (via mercado) projetos de desenvolvimento científico e tecnológico devidamente previstos no orçamento não é subsídio!
Serei eu um neocon, minha Santa Periquita (no sentido da uva portuguesa)? De acordo com o teorema das médias, haverá uma posição mais virtuosa entre um neocon e um neodes, precisamente a que ocupo desde que li o instigante livro:
LAYARD, Richard (2005) Happiness; lessons from a new science. Harmondsworth: Penguin.
Beijos
DdAB

Um comentário:

Unknown disse...
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